Aconteceu de verdade numa campanha eleitoral em Rondônia

Aconteceu de verdade numa campanha eleitoral em Rondônia

sorveteiro

ENTRANDO NUMA FRIA

Do Livro Crônicas do TRE-RO

Por Ruzevan Saraiva da Silva

Todos sabem que em toda eleição um servidor do TRE é deslocado para auxiliar os Cartórios Eleitorais.
Lógico que essa ajuda vai das urnas eletrônicas ao processo de totalização, e nesse meio tempo faz-se de tudo, o importante é vestir a camisa da Justiça Eleitoral Futebol Clube.

Sempre que falo isso vem à minha cabeça, uma frase de um colega de trabalho, servidor antigo com várias histórias sobre a Justiça Eleitoral, que entre um discurso e outro como Secretário de Informática, saía com essa: “Não temos que vestir a camisa da Justiça Eleitoral, temos que tatuar a camisa no corpo”.

Nossa! Que irado! Pensei na primeira vez. Mas, entre um trabalho e outro, no dia da eleição, sempre ocorrem situações inusitadas, principalmente com as famosas ”bocas de urna”.

Não é fácil lidar com esses cabos eleitorais, imagino o quanto a Justiça Eleitoral sofre com eles. Para se ter uma ideia da situação, em 1998, no município de Cacoal, a panfletagem era tanta que não tinha espaço na rua em frente às escola para colocar tanto santinho que era
espalhado. Aliás, até hoje me pergunto, por que candidato político recebe o nome de SANTINHO na sua propaganda?

Os dois candidatos que mais se digladiavam na referência popular era o candidato Valdir Raupp do PMDB (15) e o candidato José Bianco do PFL (25), ambos para Governo do Estado. Enfim: em um determinado colégio estava eu passando para verificar um problema em uma das urnas eleitorais, quando fui interpelado por alguns fiscais de partido que me pediram para denunciar uma boca de urna à Justiça Eleitoral.

Naquele momento eu era a Justiça Eleitoral, em carne e osso.

Um deles se aproximou de mim e disse:

– Você é da Justiça Eleitoral?! Pois tem um vendedor de picolé na frente da escola fazendo boca de urna. Vocês têm que prendê-lo!!

O fiscal me conduziu na direção do vendedor para que eu comprovasse o ato ilegal da boca de urna. Ao chegar ao local escutei o vendedor gritando em alto e bom som para todos.
– RAUPPicolé!!! RAUPPicolé!!! RAUPPicolé!!! O melhor de todos.
Não esqueçam!!!

Não acreditei, o vendedor dava ênfase ao candidato RAUPP. Não tive escolha, liguei para o Cartório Eleitoral e levaram o ”picolezeiro” para o Cadeião.

De volta ao Cartório Eleitoral, após uma hora, tive que retornar àquela escola para atender um novo chamado de verificação de urna.

Ao chegar lá… Acreditem!!! Outro fiscal veio ao meu encontro e disse:
– Vejo que o Senhor é da Justiça Eleitoral. Tem um vendedor de picolé fazendo boca de urna. Eu levo lá agora para comprovar.

Por um momento, fiquei parado e pensando: “Será que o vendedor de picolé foi liberado do “Cadeião“ e está aprontando novamente? Isso é muito descaramento!”

Para alívio de minha consciência não era o mesmo vendedor, mas outro que ocupou a vaga do anterior (típico de eleição!). Ao me aproximar do vendedor, escutei a eloquência do mesmo:

– Olha o picolé, é SÓ 25!!! Não esqueçam, é SÓ 25! Olha o picolé,
é SÓ 25!!! Não esqueçam, é SÓ 25!

Não acreditei, ele dava ênfase ao número do candidato José Bianco do PFL, número 25. Novamente acionei o Cartório Eleitoral, e outro “picolezeiro” foi detido e levado para o famoso “Cadeião”.
A partir daquele momento, retornei ao Cartório Eleitoral e não saí mais, aguardei até o encerramento da votação.

Não era possível, todas as vezes que eu saía um picolezeiro ia para o Cadeião.

Terminada a apuração, lembrei-me da situação dos vendedores que tinham sido presos, junto com os seus instrumentos de trabalho, ou seja, os carros de picolé. Dirigi-me ao local, onde funcionava o Cadeião, e logo na entrada fui escutando das pessoas que haviam sido detidas e liberadas, a seguinte frase:

– Cara! Não sabia que ficar preso na eleição era tão bom. De uma em uma hora chegava um carro cheio de picolé pra gente passar a tarde. Estou de barriga cheia que nem vou jantar hoje.

Decididamente! Que me perdoem os publicitários Nizam Guanaes e Duda Mendonça, mas os verdadeiros marqueteiros das eleições são os cabos eleitorais.

Haja picolé! Que fria eu entrei!

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