Maiana Diniz – Repórter da Agência Brasil
O escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) em Genebra, na Suíça, divulgou comunicado cobrando das autoridades brasileiras uma investigação “imediata, imparcial e efetiva” dos fatos e responsabilidades que levaram a morte de 60 detentos durante as rebeliões ocorridas em unidades prisionais de Manaus nos dois primeiros dias do ano. A nota foi divulgada nesta terça-feira (3).
“O que aconteceu em Manaus não é um incidente isolado no Brasil e reflete a situação crônica dos centros de detenção no país. Portanto, nós instamos as autoridades brasileiras a tomarem medidas para prevenir essa violência e para proteger aqueles sob custódia”, diz o comunicado.
A nota também destaca que “pessoas que estão detidas sob a custódia do Estado e, portanto, as autoridades do Estado têm responsabilidade sobre o que ocorre com elas”.
A íntegra do comunicado pode ser lida no link.
Nos últimos anos, o representante do ACNUDH para América do Sul, Amerigo Incalcaterra, vem denunciando que as violações de direitos humanos são frequentes no sistema prisional brasileiro, incluindo a prática de tortura e maus-tratos, além de condições inadequadas de vida no interior das unidades.
Em 2015, o relator das Nações Unidas contra a Tortura, Juan Méndez, concluiu que a severa superlotação das prisões brasileiras leva a condições caóticas dentro das unidades prisionais e recomendou que o governo adotasse providências imediatas.
Rebeliões
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas, a rebelião no Complexo Prisional Anisio Jobim (Compaj) começou no domingo (1º) por volta das 18h a partir de uma guerra interna entre duas facções, a Família do Norte (FDN) e o Primeiro Comando da Capital (PCC). A rebelião foi controlada por volta das 8h30 da terça-feira (2). Há confirmação de que pelo menos 56 detentos foram mortos durante o confronto, no maior massacre do sistema penitenciário do estado.
Segundo relatório da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (Seap) do Amazonas, 1.224 presos cumpriam pena em regime fechado no Complexo Prisional Anisio Jobim (Compaj), número 170% maior que o número de vagas, 454.
Horas antes do massacre no Compaj, houve uma fuga em massa de presos no Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat). O Ipat fica a cerca de 5 km do Compaj.
Na tarde de segunda-feira (2), outros quatro detentos foram mortos na Unidade Prisional do Puraquequara (UPP), na Zona Leste da capital.
Abaixo, a íntegra do texto divulgado no site do ACNUDH:
Brasil: ONU-Direitos Humanos cobra medidas contra violência em presídios após rebelião em Manaus
4 de janeiro, 2017
SANTIAGO (4 de janeiro de 2017) – O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) cobrou das autoridades brasileiras uma investigação “imediata, imparcial e efetiva” dos fatos e responsabilidades que causaram a morte de 60 pessoas privadas de liberdade durante rebeliões ocorridas em unidades prisionais de Manaus (Amazonas), no Brasil.
Em nota divulgada na terça-feira (03/01) desde a sede do ACNUDH em Genebra, na Suíça, o Escritório considerou que os fatos ocorridos em Manaus não são incidentes isolados, mas que refletem “uma situação crônica dos centros de detenção no país”.
Leia a nota do ACNUDH na íntegra:
“Pessoas que estão detidas estão sob a custódia do Estado e, portanto, as autoridades do Estado têm responsabilidade sobre o que ocorre com elas. Os Estados devem assegurar que as condições de detenção sejam compatíveis com a proibição de tortura e outros tratamentos e penas cruéis, desumanos e degradantes. Essas condições devem também ser compatíveis com o direito de toda pessoa privada de liberdade ser tratada com humanidade, e com a inerente dignidade da pessoa humana, conforme reconhecido pelos instrumentos internacionais de direitos humanos. O Comitê de Direitos Humanos em seu Comentário Geral No. 21 afirmou que esse tratamento humano é um padrão básico de aplicação universal que não pode depender inteiramente de recursos materiais e que deve ser aplicado sem discriminação.
O que aconteceu em Manaus não é um incidente isolado no Brasil e reflete a situação crônica dos centros de detenção no país. Portanto, nós instamos as autoridades brasileiras a tomarem medidas para prevenir essa violência e para proteger aqueles sob custódia.
Nós saudamos as informações de que o Governo do Estado do Amazonas está formando uma força tarefa para investigar as rebeliões e mortes no Complexo Prisional Anisio Jobim e instamos que isso leve a uma investigação imediata, imparcial e efetiva dos fatos que resultarão nos responsáveis sendo levados à justiça.”
Medidas urgentes
Em nível regional, o Representante para América do Sul do ACNUDH, Amerigo Incalcaterra, condenou a “extrema violência” ocorrida recentemente nos presídios de Manaus.
Como em situações anteriores, Incalcaterra ressaltou que “as violações de direitos humanos são frequentes no sistema prisional brasileiro, incluindo a prática de tortura e maus-tratos, bem como condições inadequadas de vida no interior das unidades”.
Nesse sentido, o Representante Regional relembrou que o então Relator das Nações Unidas contra a Tortura, Juan Méndez, concluiu após visitar o país em 2015 que a severa superlotação das prisões brasileiras leva a condições caóticas dentro das unidades prisionais, e recomendou ao governo a adoção de providências imediatas para diminuir a superlotação.
“É urgente que as medidas recomendadas pelo Relator Especial sejam implementadas de maneira a evitar novas rebeliões e mortes dentro do sistema prisional brasileiro”, comentou Incalcaterra.
Também em 2015, peritos do Sub-comitê da ONU para a Prevenção da Tortura visitaram unidades prisionais em vários estados brasileiros, incluindo Manaus. O grupo preparou um relatório sobre a situação penitenciária no país que, por decisão do governo brasileiro, permanece confidencial.
“Acreditamos que o público conhecimento do relatório do Sub-comitê da ONU contra a Tortura sobre o Brasil seria uma importante contribuição para o melhoramento das condições penitenciárias no país”, disse o Representante do ACNUDH.
Por fim, Incalcaterra pediu para as autoridades brasileiras fortalecer o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, segundo o que estabelece o Protocolo Facultativo da Convenção da ONU contra a Tortura.
FIM
Informação Relacionada
– Confira o relatório do Relator Especial da ONU contra a Tortura após visitar o Brasil (2015): http://ap.ohchr.org/documents/dpage_e.aspx?si=A/HRC/31/57/Add.4
– Saiba mais sobre a visita do Sub-comitê da ONU para a Prevenção da Tortura (SPT) ao Brasil (2015): http://acnudh.org/pt-br/prevencao-da-tortura-no-brasil-serios-desafios-continuam-mas-e-possivel-avancar-peritos-da-onu-concluem/
– Nota: “ACNUDH condena violência em presídios brasileiros” (29/08/2014): http://acnudh.org/pt-br/21813/