No 247
Por Paulo Moreira Leite
Num país onde a taxa de juros é uma indecência legalizada, ninguém tem o direito de criticar a redução de 0,75% anunciada pelo COPOM. (Pode-se até reivindicar uma redução maior — mas o debate, aqui, não é este).
Ninguém tem o direito, porém, de imaginar que o caminho para a recuperação do crescimento foi aberto a partir desta decisão. Para começar, a taxa básica de juros — agora em 13% — continua impraticável para servir de estimulo aos investimentos e a criação de empregos.
Outra questão é que mesmo uma taxa de juros muito mais baixa do que 13% está longe de constituir — isoladamente — um remédio infalível para se enfrentar um ambiente de estagnação econômica e destruição do aparato produtivo de um país ou mesmo de uma região econômica. A experiência ensina duas coisas: taxas altas de juros costumam funcionar como um obstáculo intransponível para o crescimento mas a recíproca nem sempre é verdadeira.
O prolongado pântano da economia europeia, principal foco de doença da economia mundial, é um caso didático a esse respeito. Em estagnação permanente desde o colapso dos derivativos de 2008/2009, a União Europeia tem praticado os juros mais baixos de sua história recente — sem resultados significativos.
Entre 2009 e 2011, a taxa de juros europeia ficou em 1%. Caiu para 0,75 % no ultimo trimestre de 2012, desceu para 0,5% em maio de 2013 e desde maio de 2016 se encontra em 0%. Salvo pequenas oscilações, estatísticas que nem de longe beneficiaram a maioria das pessoas nem serviram para alterar o quadro geral, nada ocorreu para diminuir o desemprego nem para alterar o ambiente social e muito menos criar um horizonte de confiança. A instabilidade política explica-se por isso.
Com uma imensa quantidade de clientes quebrados, e juros baixos demais, o sistema bancário europeu prefere entesourar os recursos em seu cofres em vez de fazer empréstimos para empresas e correntistas que não transmitem a menor segurança quanto a capacidade de honrar seus compromissos. Neste ambiente, mesmo a Alemanha de Angela Merkel, até há pouco uma potência regional, dá sinais de enfraquecimento.
Este é o curso atual da economia brasileira e nada indica que ela seguirá um rumo diferente, com a dupla Temer-Meirelles no comando do Estado. Juntos, desde maio de 2016 os dois tomaram diversas medidas de política econômica, que nada mais representam do que tentativas de cortar pela raiz todas as possibilidades do Estado contribuir para uma retomada do crescimento através dos investimentos.
Esse é o centro da PEC do teto dos gastos, que simplesmente proíbe o governo de elevar investimentos que poderiam estimular o crescimento — durante 20 anos.
Pela mesma razão, o governo quer aproveitar toda e qualquer oportunidade para esvaziar empresas públicas que poderiam mudar o rumo das coisas, seja no plano do crédito — pela Caixa, Banco do Brasil, BNDES — seja em obras de infraestrutura, a começar pela Petrobras. O estrangulamento dos governos estaduais faz parte do mesmo programa.
Útil para disfarçar momentaneamente a fantasia de um governo que necessita de notícias favoráveis, a redução de 0,75% é parte de um ambiente desesperador e sem perspectivas.
Mesmo a queda da inflação só pode ser anunciada através de sorrisos amarelos — pois os preços caíram pela queda de consumo produzida por uma recessão histórica. Não é a economia que ficou mais equilibrada mas o povo é que está comendo menos.
Coerentes no próprio erro, conduzem o país para um desastre sem saída. Uma das lições da crise de 2008/2009 é que nem mesmo os Estados Unidos, pátria do liberalismo econômico, foi capaz de tirar o pé do atoleiro sem apoio do Estado. Foi assim que, entre outras medidas, Barack Obama realizou uma estatização parcial do setor automobilístico. Apesar de seus vergonhosos momentos de delírio, nem os projetos de Donald Trump ignoram isso.
Esta é a situação real. Sem capacidade para qualquer mudança, o recurso é vestir uma máscara.