No blog Legis-Ativo do Estadão
Por João Paulo Viana
Fundado em 1977, durante o regime militar, o município de Vilhena é um dos mais desenvolvidos do jovem estado de Rondônia. A cidade encontra-se localizada na região do cone sul do estado, próximo à divisa com o Mato Grosso, e conta atualmente com uma população de aproximadamente 100 mil habitantes.
O processo de colonização do município se deu majoritariamente por imigrantes sulinos, provenientes dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Importante produtor de soja, milho, arroz, café e feijão, Vilhena também se destaca na pecuária com um dos maiores rebanhos do estado. No passado, a extração de madeira exerceu forte influência na economia municipal. Trata-se de uma região promissora, numa unidade federada que apresenta taxas de crescimento bem superiores à média nacional.
No plano político, Vilhena possui uma história bastante conturbada. A cidade foi governada durante mais de uma década pela família Donadon, um dos mais poderosos clãs da política rondoniense durante os anos de 1990 e 2000. De trajetória bastante controversa, os Donadon administraram o município em período de grande desenvolvimento. Mesmo após a condenação e o afastamento da vida pública, decretados pela Justiça, de seus principais caciques, Melki, Natan e Marco Antônio, e longe de se comparar aos anos dourados do domínio do clã na política estadual, a família detém ainda hoje grande prestígio político e eleitoral na região. Principalmente depois do fracasso da gestão do prefeito José Luiz Rover (PP), liderança que chegou ao poder em oposição aos Donadon, mas após oito anos viu sua administração chegar ao fim de forma melancólica, com a prisão de Rover e seu vice, Jacier Rosa Dias (PSC), em novembro de 2016, ainda no exercício do mandato.
Nesse contexto, a eleição municipal de 2016 foi marcada pelo retorno do clã Donadon ao poder na cidade, com a vitória nas urnas de Rosani Donadon (PMDB), esposa do ex-prefeito Melki Donadon. Apesar de empossada no cargo, o mandato de Rosani encontra-se sub judice, em ação movida pelo Ministério Público Eleitoral, sob a alegação de abuso de poder político e econômico nas eleições de 2008, quando ela foi candidata a vice-prefeita, na chapa do esposo, Melki. A família também possui uma representante na Assembleia Legislativa do Estado, Rosângela Donadon (PMDB), além de um vereador na cidade, Júnior Donadon (PSD).
É justamente na Câmara Municipal de Vilhena que reside atualmente o foco da profunda crise política que abala o município. Entre outubro e novembro de 2016, sete vereadores, de um total de 10 parlamentares, tiveram a prisão decretada pela Polícia Federal, sob a acusação de corrupção e lavagem de dinheiro. Conforme as investigações, os vereadores participavam de um esquema de corrupção para a aprovação de loteamentos no município. Na eleição de 2016, três deles, Carmozino Moreira (PSDC), Júnior Donadon (PSD) e Vanderlei Graebin (PSC), foram reeleitos para o cargo, sendo diplomados e, posteriormente, empossados. Após a cerimônia de posse, os vereadores retornaram para Porto Velho, onde se encontram presos. Ainda em janeiro deste ano, a Justiça determinou o pagamento de salários aos parlamentares presos, após a Câmara de Vereadores, em votação unânime, suspender a remuneração. Até então, apenas Júnior Donadon, no mês de dezembro, havia conseguido na Justiça o direito ao recebimento de salário.
No dia 31 de janeiro, a Câmara de Vereadores de Vilhena aprovou a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os vereadores presos. Nove, num total de 10 parlamentares, foram favoráveis ao recebimento da denúncia, protocolada em meados de janeiro, logo após a posse dos representantes presos. No último final de semana, os três vereadores foram notificados na prisão sobre a CPI que pode cassar seus mandatos. Eles terão 10 dias para apresentar defesa contra a cassação. Posteriormente, os membros da CPI decidirão sobre o arquivamento ou a continuidade do processo, tendo a comissão o prazo de 90 dias, a contar da data de notificação dos vereadores, para concluir o processo. Caso o julgamento não ocorra nesse prazo, o processo será arquivado. Para a cassação dos acusados, será necessário o voto de 2/3 dos representantes da casa legislativa de Vilhena.
O caso da Câmara de Vereadores de Vilhena não é singular. Certamente, em muitos municípios do país a corrupção se alastra pelo Poder Legislativo. Não obstante, vale uma reflexão acerca do papel dos partidos políticos nesse processo. É necessário que as legendas partidárias exerçam a punição desses parlamentares. Trata-se de uma situação bastante complexa, em que o partido permite que um representante preso continue exercendo o mandato filiado à legenda.
Se a Lei da Ficha Limpa representou um avanço e uma conquista da sociedade brasileira, ela já demonstrou que não pode tudo. As agremiações partidárias precisam realizar um filtro ético e moral de seus filiados e mandatários, assim como puni-los com a expulsão. Casos como esse apenas contribuem negativamente para a perpetuação do descrédito dos cidadãos em relação à representação política e aos partidos, já tão desmoralizados perante a opinião pública.
João Paulo Viana é professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Rondônia (DCS/UNIR). Doutorando em Ciência Política na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).