O FIM DA HISTÓRIA?

O FIM DA HISTÓRIA?

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Prof. Mestrando Moisés Peixoto

Quando o “muro do Berlim” ruiu, talvez apressadamente demais, houve uma onda de euforia neoliberal que pretendeu retificar a história contemporânea, extirpando dela as páginas dedicadas à experiência socialista.

Numa leitura canhestra – influenciada por Alexandre Kojeve- da filosofia da História de Hegel, apareceu um profeta nissei chamado Francis Fukuyama que prognosticou o fim da História, com isso querendo dizer que a democracia liberal e a economia de mercado eram o ponto final da evolução política e social da humanidade.

Como disse então Eric Hobsbawn, aquela era uma profecia de vida muita curta, logo depois veio à guerra do Golfo e a roda da História continuou a girar.
Agora, apareceu no Brasil um estadista Pernambucano de Belo Jardim, incorporado pela deusa grega Lethe ou Lesmosyne que foi “encostado” no Ministério da Educação pelo golpe de 2016.

Ele fez aprovar mais uma reforma do Ensino Médio, cuja primeira medida na condição de Encosto Chefe do MEC, através dela, foi não somente prognosticar, mas promover mesmo o fim da História, outra vez.

O que tem certos políticos para acertar logo a História, quando detém um pouco de poder nas mãos? – Numa leitura freudiana, o gesto poderia ser interpretado com o assassinato simbólico dos professores de História pelo atual ministro. Lembre-se que ele manteve uma polêmica azeda com seus mestres, na época da escola parque do Recife, chamando-os de “subversivos”.

É como se vingasse deles, agora, retirando a disciplina do currículo do ensino médio. Mas essa seria uma interpretação rasa, superficial.

Há outra interpretação para isso: a mitológica. Ao longo da própria História, havia também os que desejam o esquecimento para por no lugar da História. Na Grécia antiga, havia os gregos que fizeram da memória uma deusa chamada de Mnemósine que se uniu a Zeus gerando nove musas, entre elas: Clio [história] com a intenção de guardar os segredos do passado, os mistérios do além e os grandes feitos dos heróis, por meio do canto das musas.

Desse casamento entre Zeus e Mnemósine, Ele adquire poder sobre os demais deuses do Olimpo. Sem ela, Ele estaria mais próximo das rochas do que dos homens, silencioso, insciente do passado, sempre idêntico a si mesmo, sem planos. Pouco se distinguiria dos seus antepassados.

Este casamento também lhes conferia o dom da imortalidade, pois quem se torna memorável jamais morreria! Outra função importante da Deusa Memória era a seleção das informações que seriam transmitidas, por isso existe uma relação entre Mnemosyne e seu opostoLethe ou Lemosyne que personificava a deusa do esquecimento.

Na Grécia Antiga, Lete ou Léthê que em grego antigo literalmente significa “esquecimento” é também o nome de um dos rios do Hades. Aqueles que bebessem de sua água experimentariam o completo esquecimento. O estadista Pernambucano certamente bebeu muito das águas do rio Ipojuca que banha sua cidade: Belo Jardim ao longo de sua vida. Etimologicamente, “Ipojuca” é um termo originário da língua tupi antiga: significa “água das raízes podres”, cujo sabor a gente faz de tudo para esquecer.

O Rio Ipojuca é o equivalente pernambucano ao mitológico rio Lete. Ele de tanto beber e se banhar nele ficou possuído pela deusa do esquecimento; tornou-se seu adepto e por isso sua má vontade e falta de interesse pelas aulas de Históriada época da escola parque do Recife.

Mas essa interpretaçãomitológicatambém seria insuficiente.

Para esses “educadores pragmáticos” a História não tem a menor serventia para a formação de uma força-de-trabalho barata e dócil, destinada a um mercado de locação de serviços desregulamentado. Como, aliás, a Filosofia, a Sociologia e as Artes. Para que tanta coisa (a formação humanística), quando se trata de produzir “massa de manobra” para a exploração desse capitalismo (rentista) selvagem? – Deixa para os filhos da burguesia, da alta classe média, dos herdeiros dos grandes impérios industriais, que precisam sim de uma formação integral, ampliada, de perfil crítico, inventivo.

E que podem pagar – caro – por isso. É o reforço da divisão social entre que manda e quem obedece. Quem tem e quem não tem capital social, capital simbólico, capital intelectual.

A história já foi prisioneira de inúmeras práticas discursivas. A mais conhecida é a história genealógica, de Nietzsche e Foucault. A história, como mera racionalização de uma vontade de poder ou de potencia. Mas ela não só serve para isso. A história é vida e não um cadáver embalsamado para contemplação de eruditos.

A história é o domínio dos possíveis, da virtualidade, daquilo que ainda não é, mas pode vir a ser. É essa a concepção de História que precisamos. Não a história antiquária, ou a da erudição balofa e vazia. Não a história como racionalização da epopeia do vencedor.

A história que está viva é a história das nossas utopias, dos nossos sonhos, dos projetos de alteridade social.
Essa história nenhum avicultor poderá matar ou suprimir. Pode reescrever ao sabor de suas conveniências políticas. Mas ela sempre viverá, como ideia reguladora, a guiar o ideal de justiça, de beleza, de verdade dos homens e mulheres de boa vontade.

Ao acabar com a obrigatoriedade do estudo da História no Ensino Médiopensam que conseguirão fazer com a maioria do povo esqueça-se das conquistas sociais das quais foram protagonistas e beneficiados através dos governos petistas que elegeram através do voto direto, apesar dos erros cometidos ao longo do seu caminho. Mas, esquecem se de que, além do fato de que a História sempre viverá e em tempo de internet, esse esquecimento que estão promovendo é um tiro que sairá pela culatra, pois, não se apaga da cabeça do povo o que se tornou memorável, quiçá lendário.

Prof.Dr. Michel Zaidan Filho
Professor-Titular do centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Prof. Mestrando Moisés Peixoto da Silva
Professor de História do Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública de Ensino de Rondônia e aluno do Mestrado em História e Estudos Culturais pela UNIR/UFRO.

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