Advogados acusam vazamento ilegal de gravações da condução coercitiva do ex-presidente para produção cinematográfica
El País
BREILLER PIRES
A colaboração da Polícia Federal com um filme sobre a Operação Lava Jato provocou a insatisfação de membros do Partido dos Trabalhadores (PT) e, sobretudo, de Luiz Inácio Lula da Silva. Na última quinta-feira, a defesa do ex-presidente enviou uma petição ao juiz Sérgio Moro em que reivindica o sigilo de imagens que teriam sido repassadas por autoridades aos produtores do longa “Polícia Federal: a lei é para todos”. De acordo com o advogado Cristiano Zanin, a produção obteve acesso ilegal a filmagens captadas por um agente da Polícia Federal durante a condução coercitiva de Lula com o intuito de reconstituir a cena, que deve compor o desfecho da obra.
“Os vídeos, que teriam sido entregues a terceiros, mostram a residência, a intimidade e a coleta de depoimento do ex-presidente Lula”, disse Zanin em um seminário sobre a Lava Jato promovido pelo PT nesta sexta-feira, em São Paulo, onde atribuiu o vazamento à PF. “É uma situação muito grave. Em vez de zelar pelo material confidencial, aparentemente as autoridades o entregaram à produtora do filme, que é alinhado às ideias dos acusadores do ex-presidente e detém um material que a Constituição Federal considera privado.”
Na petição, os advogados de Lula citam trechos de entrevistas em que os produtores do filme revelam ter tido acesso a vídeos para auxiliar na reconstituição de passagens da Operação Lava Jato. Além do sigilo, eles solicitam à produtora New Group Cine & TV LTDA, responsável pelo projeto cinematográfico, que não utilize as imagens da condução coercitiva. Ainda no evento do Partido dos Trabalhadores, Zanin afirmou que a suposta divulgação pela Polícia Federal é “mais uma prova de que os processos da Lava Jato não observam garantias legais”.
Ao jornal O Globo, o produtor Tomislav Blazic negou ter recebido vídeos da Polícia Federal. Em entrevista ao UOL, em maio do ano passado, entretanto, ele contou que teve acesso a “informações de bastidores” sobre a Lava Jato fornecidas pela PF, que cedeu suas instalações em Curitiba para as filmagens e prestou consultoria à produção. Blazic também afirmou que o filme, que custou 15 milhões de reais e tem lançamento previsto para agosto, é apartidário.
Quem interpretará o ex-presidente Lula é o ator Ary Fontoura. Em 2016, ele teceu críticas públicas ao PT e a Dilma Rousseff, além ter militado pelo impeachment da então presidente – assim como Marcelo Serrado, que fará o papel do juiz Sérgio Moro. O ator participou de manifestações contra o governo Dilma e, em uma das ocasiões, saiu às ruas vestindo uma camisa estampada com a foto do personagem que irá incorporar no cinema. Serrado não esconde sua admiração por Moro e se encontrou pelo menos três vezes com o juiz para buscar referências para o papel. Tanto ele quanto Fontoura estiveram na sede da PF em Curitiba durante as gravações para conhecer mais a fundo as investigações da Lava Jato.
Integrantes do PT se manifestaram sobre o filme no seminário do partido, alegando que o vazamento das imagens faria parte de uma nova investida do juiz Sérgio Moro para espetacularizar as acusações contra Lula. O ex-presidente, que discursou no fim do evento, também demonstrou irritação ao comentar sobre o repasse das gravações. “Entraram em minha casa com uma câmera de filmar no peito e já entregaram as imagens para um filme. Não podemos aceitar esse tipo de abuso de autoridade.” Lula ainda aproveitou para convocar os parlamentares petistas para uma ofensiva contra o que chamou de “excessos” da Justiça, pressionando pela aprovação do projeto de lei criticado por juízes e procuradores em tramitação no Senado. “É importante mostrar o outro lado da Lava Jato. O PT tem obrigação de brigar um pouco mais por essa causa no Congresso Nacional. A gente não pode deixar de aprovar a lei de abuso de autoridade, porque ninguém está acima das instituições. Vou nessa briga até o fim.”