“Nicinha morreu porque não aceitou as injustiças das barragens calada”
Do Mab
No final da noite de quinta-feira (23), após 13 horas de audiência no Fórum Criminal de Porto Velho (RO), o Tribunal do Júri condenou Edione Pessoa da Silva pelo assassinato de Nilce de Souza Magalhães, a Nicinha. A pescadora e militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) foi assassinada em 7 de janeiro de 2016, mas seu corpo foi achado apenas cinco meses depois no fundo do lago da Usina Hidrelétrica Jirau, com uma marca de tiro na cabeça e com as mãos e pés amarrados a uma pedra.
A sentença de 15 anos e seis meses em regime fechado pelos crimes de homicídio qualificado e ocultação de cadáver foi definida pela juíza Kerley Regina Ferreira, da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Porto Velho.
Todavia, Leonardo Batista da Silva, primo de Edione, foi absolvido do crime de ocultação de cadáver e recebeu a pena de um ano em regime aberto por furto. Leonardo permanece preso apenas devido a outro processo judicial que está em andamento.
De acordo com o MAB, o caso de Nicinha representa as violações de direitos humanos e o tratamento despendido aos atingidos pelas hidrelétricas em Rondônia e no resto do país. “Nicinha morreu porque não aceitou as injustiças das barragens calada”, afirma o movimento em nota.
O MAB ainda cobra que as investigações prossigam e que se encontre todos os envolvidos no assassinato da mandante. “Exigimos investigação completa e julgamento a todos. Seguiremos firmes na luta, denunciando a perseguição aos atingidos por barragens e cobrando para que nenhuma investigação seja jogada para baixo do tapete para proteger gente mais poderosa”, diz a nota.
Por fim, o movimento cobra do consórcio Energia Sustentável do Brasil (ESBR), responsável pela Usina Hidrelétrica de Jirau, os direitos de todos os atingidos por barragens, incluindo a comunidade de Velha Mutum Paraná, onde Nicinha foi obrigada a se mudar devido aos impactos do empreendimento na região.
Histórico
Nicinha foi vista pela última vez na barraca de lona onde morava com seu companheiro, Nei no dia 7 de janeiro de 2016, em um acampamento com outras famílias de pescadores, atingidas pela Usina Hidrelétrica (UHE) Jirau, na localidade chamada de “Velha Mutum Paraná”, em Porto Velho (RO).
Dias após seu desaparecimento, Edione Pessoa da Silva foi preso após confessar o assassinato da militante. Entretanto, Edione conseguiu fugir da Penitenciária Estadual “Edvan Mariano Rosendo” no dia 11 de abril, localizada em Porto Velho (RO), e foi recapturado apenas em agosto.
A liderança era conhecida na região pela luta em defesa das populações atingidas, denunciando as violações de direitos humanos cometidas pelo consórcio responsável pela UHE de Jirau, chamado de Energia Sustentável do Brasil (ESBR). Filha de seringueiros que vieram do Acre para Abunã (Porto Velho) em Rondônia, onde vivia há quase cinquenta anos, foi obrigada a se deslocar para “Velha Mutum Paraná” junto a outros pescadores. No local, não existia acesso à água potável ou energia elétrica.
Nilce realizou diversas denúncias ao longo desses anos, participando de audiências e manifestações públicas, entre as quais, apontou os graves impactos gerados à atividade pesqueira no rio Madeira. As denúncias geraram dois inquéritos civis que estão sendo realizados pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual sobre a não realização do Programa de Apoio à Atividade Pesqueira e outro, de caráter criminal, em função de manipulações de dados em relatórios de monitoramento.