A troca era apontada como uma das manobras para “estancar a sangria”. Indicado de Temer seria próximo a José Sarney e foi defendido pelo PMDB
Na Carta Capital – Em maio de 2016, o Brasil descobriu o conteúdo de uma conversa entre o senador Romero Jucá (PMDB-RR) e o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado. O diálogo descortinava o fato de que o impeachment de Dilma Rousseff (PT) era, ao menos em parte, uma estratégia para barrar as investigações da Operação Lava Jato. “Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria“, disse Jucá. “É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional”, respondeu Machado. “Com o Supremo, com tudo”, concluiu o parlamentar.
Após o impeachment, diversas formas de pressão contra a Lava Jato foram desencadeadas. Uma delas seria a troca do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. Nesta terça-feira 8, a substituição do comandante da PF foi oficializada. Daiello deixará o cargo no qual estava desde 2011 e será substituído por Fernando Segovia.
O nome de Segovia não será recebido sem controvérsias. Entre as diversas funções que ocupou como delegado, como adido policial na África do Sul, está a de superintendente da PF no Maranhão, estado da família Sarney. Segundo múltiplos relatos publicados pela imprensa, Segovia seria ligado ao ex-presidente José Sarney (PMDB).
De acordo com reportagem publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo em 15 de setembro, “a relação com Sarney” gerava resistências ao nome de Segovia dentro da Polícia Federal. “Nos bastidores”, afirmou o jornal, “Segovia era visto como o nome que o PMDB queria indicar para a vaga de Daiello.”
Dias antes, a revista Veja afirmou que havia “forte movimentação da alta cúpula do PMDB” em torno do nome de Segovia. Outro que defendia o novo diretor da PF para o cargo era o ministro da Justiça de Temer, Torquato Jardim. Jardim foi advogado da ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney, filha de José Sarney.
A troca no comando da Polícia Federal se dá no momento em que a cúpula do PMDB é alvo da Lava Jato. Segundo um relatório da própria Polícia Federal, o presidente da República, Michel Temer, tinha um papel de comando no chamado “quadrilhão do PMDB”.
Um relatório da PF sobre o caso compilou as diversas acusações contra Temer, nas quais aparecem também outros cinco peemedebistas: os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral) e os ex-deputados Eduardo Cunha (RJ), Geddel Vieira Lima (BA) e Henrique Alves (AL).
Os três últimos estão presos. Padilha e Moreira Franco, assim como Temer, se livraram momentaneamente do processo depois de a Câmara rejeitar a denúncia por organização criminosa e obstrução de Justiça apresentada pela Procuradoria-Geral da República.
Ministério Público
Pode causar problemas para a Lava Jato a relação entre a Polícia Federal e o Ministério Público Federal na gestão de Fernando Segovia. Em maio de 2013, ele defendia a PEC 37, alteração constitucional que, segundo promotores e procuradores, iria prejudicar o poder de investigação do MP. “A PEC vem justamente para tentar delimitar qual seria esse poder de atuação dos Ministérios Públicos, porque não há um regramento em si”, afirmou em programa da Associação dos Juízes Federais do Brasil.
“Se você verificar tanto no texto constitucional quanto nas legislações inferiores, não está em nenhum momento delineado esse procedimento de investigação”, disse Segovia. “O MP não tem esse poder de investigar e começou a investigar, só que sem controle, através de procedimentos que estão inclusive sendo questionados junto ao STF”, concluiu.
A PEC 37 foi derrubada pouco depois dos comentários de Segovia, em junho de 2013, em meio à convulsão social das manifestações ocorridas naquele mês em todo o Brasil.
A PF e o MP têm um histórico de atritos ao longo dos anos por conta de uma competição entre as categorias, em especial em termos de prerrogativas. No avanço da Lava Jato até aqui, muitos consideram que a ausência desses atritos e o trabalho complementar entre as duas instituições foi essencial.