Na manhã desta quarta-feira, 22, o legislativo municipal da Capital realizou uma Sessão Especial que teria como tema de palestra a restruturação familiar.
A bem da verdade, o palestrante só tratou da polêmica questão sobre ensinar ou não o respeito à diversidade de gênero nas escolas. Seu discurso foi contra pensamentos de intelectuais de esquerda e sobre como crianças devem aprender a lidar com a sexualidade nas salas de aula.
Foi um culto evangélico, seguido de palestra e depoimentos contra o debate sobre a diversidade sexual e familiar para crianças na rede pública de ensino.
Sem a devida divulgação, não compareceram sequer os interessados em defender a padronização do conceito de família sob a ótica do fundamentalismo religioso.
Poucos vereadores e na galeria, apenas 8 pessoas presenciaram a discussão vazia de dados científicos.
Só duas vozes dissonantes na sessão e sem convite, a da responsável por este blog, como ativista do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Maria dos Anjos (Cedeca) e da advogada Marília Benincasa, da Comissão da Diversidade Sexual da OAB-RO.
Foi como estarmos num bote, em mar revolto, cercadas de tubarões.
O secretário municipal de educação fez uma declaração lúcida, esclarecedora, para acalmar os ânimos.
Mas, foi inevitável o confronto nervoso de posições, afinal, a discussão girou em torno de uma questão que não existe, a ideologia de gênero.
O que naturalmente ocorre com o passar dos tempos é a adequação/ampliação dos debates em sala de aula sobre a pluralidade familiar e a diversidade de gêneros quando se fala de família e sexualidade a adolescentes.
E isso ocorre não só por mudanças de comportamento, mas por força de novos entendimentos jurídicos.
Se foram reconhecidas no ordenamento jurídico a união estável homoafetiva, a adoção por homossexuais e a chamada família parental, não pode a Câmara de Porto Velho promover um debate só com evangélicos em campanha para fazer prevalecer o conceito de família desta parcela da sociedade.
São várias as estruturas familiares que gozam de direitos tanto quanto uma família que se forma com um homem e uma mulher.
O que o vereador autor do projeto quer, é impedir que essa realidade seja debatida nas escolas. Ele e todos que o apoiam contra o debate sobre a pluralidade de gêneros.
Aliás, Transexuais e travestis também podem ter o nome social incluído no documento de Cadastro de Pessoas Físicas (CPF). É só procurar uma unidade de atendimento da Receita Federal e pedir a inclusão.
Marilia Benincasa esclareceu todas as mudanças que ampliaram direitos aos chamados LGBTs, e por isso, destacou que sendo realidade, não pode este ser um tema tratado como tabu.
Se a Constituição Federal diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza e que a igualdade deve ser promovida, o debate sobre pluralidade familiar e de gênero não pode ser inibido.
Outro projeto que causa polêmica é o Escola Sem Partido, que acaba influenciando em qualquer discussão sobre família e material didático.
O movimento Professores Contra o Escola sem Partido criou um mapa para demonstrar onde tramitam projetos que cerceiam a liberdade de estudantes e professores.
“Nos 27 estados, 15 têm projetos tramitando em Assembleias Legislativas que propõem “escola sem partido”, “escola livre” ou ainda, no caso de Pernambuco, a proibição de “qualquer temática relacionada a ideologia de gênero”. Os projetos em âmbito municipal somam 66, em cidades em 22 estados. Em todas as esferas, apenas nove já foram de fato aprovados.”
A sessão de hoje na Câmara poderia ser útil se houvesse participação de especialistas em educação e de representantes dos Ministérios Públicos Estadual e Federal que já disseram por que o debate sobre diversidade de gênero não pode ser limitado por conceitos religiosos.
Foi um fiasco quanto à expectativa de mobilização dos que apoiam o projeto do vereador Marcelo Cruz e absolutamente ineficaz para dissolver a polêmica.
Pela falta de pluralidade de ideais, foi uma manhã de desperdício de dinheiro público na Câmara, afinal, foi feito por e para um grupo de evangélicos que defendem a limitação do ensino a um modelo familiar desconectado da realidade.
Se querem qualificar o debate necessário para esclarecer os limites legais a projetos estapafúrdios, promovam uma audiência pública democrática e com ampla divulgação.
Não ocupem o legislativo municipal para fazer campanha da ideologia do retrocesso.
A vereadora Cristiane Lopes disse que a ‘casa do povo’ é aberta a todos, mas só os evangélicos foram devidamente convidados para debater um tema que interessa a todos. É o direito de todos terem direitos que está em jogo.
Convoquem todos e todas e o plenário não estará decorado só com jornais da Igreja Universal do Reino de Deus.