No 247, Por Tereza Cruvinel – Pedro Parente e seu staff, pelo visto, não fizeram a pausa do Natal e do Ano Novo. Ficaram trabalhando no fechamento do acordo pelo qual a Petrobrás pagará cerca de R$ 10 bilhões (6,5 vezes o valor já recuperado com a Lava Jato) aos acionistas norte-americanos que entraram na Justiça pedindo ressarcimento por prejuízos com a queda no valor das ações em função dos casos de corrupção. No lusco-fusco das festas de final de ano, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, também avalizou o acordo da Embraer com a Boeing que incluirá a área que produz equipamentos militares para as atividades de defesa. O golpe não tira férias, em sua compulsiva ação contra o interesse nacional.
O acordo firmado pela Petrobrás com os investidores americanos, que o deputado Wadih Damous já qualificou como roubo, sangra a empresa e castiga os acionistas brasileiros para contemplar interesses estrangeiros. Ele contraria frontalmente uma disposição do Código de Processo Civil, que recomenda aos órgãos da União (e isso vale para as empresas estatais) o recurso até à última instância em todas as disputas judiciais.
Mas Pedro Parente, antes mesmo da condenação em primeira instância, resolveu fazer o acordo, sem esperar que a ação coletiva dos acionistas americanos chegasse à Suprema Corte. No Brasil, em qualquer disputa judicial contra órgãos do Estado, se o litigante ganhar na primeira instância, o gestor público recorrerá à segunda instância. E se perder, terá que recorrer aos tribunais superiores. Todos os órgãos do governo assim se comportam, por recomendação da AGU. Em 2001, uma lei atenuou esta exigência, tornando obrigatórios os recursos apenas em ações de valor superior a 60 salários-mínimos. Em 2015, houve novo afrouxamento, mas apenas em relação a assuntos já pacificados nos tribunais, ou que sejam objeto de súmulas vinculantes. Em linguagem vulgar, para temas que já tenham sido julgados, gerando jurisprudência. No mais, os dirigentes de órgãos públicos devem sempre esgotar as possibilidades de recurso, mesmo sabendo que vão perder. Estão impedidos de fazer acordo. Aprendi isso quando presidi a EBC. Em algumas situações entendi que um acordo poderia ser mais vantajoso para a empresa, encerrando pendências antigas, mas os juristas me ensinaram que seria preciso recorrer enquanto fosse possível. E por que Pedro Parente preferiu fazer logo este acordo, ao invés de proceder conforme a recomendação do direito público brasileiro? A resposta da Petrobrás não é convincente: mais adiante, poderia sair mais caro.
Talvez isso acontecesse, mas a Petrobrás ganharia um tempo financeiramente precioso, além de estar observando outros interesses, inclusive o dos acionistas brasileiros, que vão pagar pelo acordo. A ação dos americanos se arrastaria por mais um ou dois anos, segundo advogados da área, antes de chegar à Suprema Corte. Enquanto isso, a situação da empresa iria melhorando, não seria preciso gastar agora o pouco que foi recuperado pela Lava Jato (R$ 1,5 bilhão) e quase tudo o que foi arrecadado com a venda de ativos para ressarcir os investidores americanos. Já os acionistas minoritários brasileiros, como disse ao Globo a advogada Érica Gorda, da USP, “estão pagando a conta duas vezes”. Perderam com o efeito Lava Jato, que derrubou as ações, e agora estão perdendo de novo, com a destinação destes R$ 10 bilhões aos investidores americanos, notícia que já derrubou internamente o valor das ações.
O acordo de Parente fecha um círculo nefasto para a Petrobrás, para o Estado brasileiro e para os acionistas minoritários. A Lava Jato, com a ajuda hoje para lá de conhecida de juízes e procuradores americanos, atingiu a Petrobrás com um tiro de canhão. Com a consequente queda das ações, os investidores americanos foram à Justiça e agora serão prontamente ressarcidos. Ficamos nós chupando o pirulito.
O golpe é um moto contínuo. Não tem recesso nem tira férias, em sua compulsiva ação contra os direitos individuais e coletivos e o interesse nacional.