É tempo chuvoso, de água a subir calçadas e bueiros a arrotar a catinga da capital. Da parte mais pobre à mais nobre, sobe o fedor das coisas erradas.
É assim desde que aqui nasci e desgraçadamente, posso dizer que piorou muito.
Não me refiro à fedentina por falta de saneamento básico adequado, mas a que envolve nossos poderes públicos. Fedem o legislativo, o executivo e o judiciário.
Se instalarem em prédios novos, suntuosos, não amenizou o bodum.
Os escândalos não param, se acumulam.
No legislativo, temos ex-representantes do povo presos, a serem presos, condenados sem pena restritiva de liberdade e impunes. Do executivo, a mesma coisa.
No judiciário, temos juízes ‘punidos’ com a aposentadoria compulsória, aquele ‘quase prêmio’ a quem falta com seus deveres funcionais.
É dos agentes públicos e políticos a pior inhaca.
Mas, que povo é esse que de tão submetido, se acostumou ao mau cheiro ao invés de reclamar?
Pior, que contribui com a pestilência?
Fosse justo culpar só os que exercem funções públicas não estaria vendo no poder, eleitos ou não, herdeiros da imprestável mentalidade política da época do meu primeiro sutiã.
Os cidadãos comuns são cúmplices do romântico fingimento de que o poder emana do povo e em seu nome é exercido.
Nós mentimos, vós mentis, eles mentem.
Mais um escândalo veio à tona com as águas de marco e de novo envolvendo os poderes legislativo e executivo do estado.
Uma escuta clandestina revelou conversa pra lá de indecorosa entre o presidente da Assembleia Legislativa, Maurão de Carvalho e o deputado Jesuíno Bouabaid.
Truncado ou não o diálogo, como alegam os envolvidos, era de utilizar instrumentos legais para chantagear o governador Confúcio Moura que falavam.
Era sobre sabendo, não mandarem investigar imediatamente denúncias que poderiam derrubar o governo e evitar o prejuízo de milhões ao estado.
Os deputados divulgaram umas notas focando apenas na gravidade da interceptação ilegal da conversa.
O governador se limitou a dizer que diante de tão grave fato só lhe cabe o silêncio.
Foi há poucos dias e já não se fala mais nisso. O povo inalou a catinga com espantosa normalidade.
Tem jornalista que até qualifica os que usam a estratégia da desfaçatez diante de um escândalo como admiráveis articuladores políticos.
Tamanha a impureza, sistêmica e banalizada deve ter sequelado o cérebro dos rondonienses para justificar frouxidão e acomodação à indecência.
A possibilidade de higienização está logo ali, nas eleições de outubro.
Infelizmente, o que vemos em veículos de comunicação e nas redes sociais são perspectivas de intenção de votos em vários políticos catingosos.
E assim se alternam os períodos chorosos e fedorentos em Rondônia.
Da parte mais pobre à mais nobre, o insuportável mau cheiro a que se referiu Gullar:
Falo de um odor que entranha em tudo e que se espalha
pela cidade inteira feito gás
e por mais
banhos que tomemos
e por mais
desodorantes
que usemos
(na boca, na axila
na vagina;
no vaso do banheiro,
no setor financeiro)
não se acaba esse cheiro