Mais um ativista foi assassinado enquanto a Comissão Pastoral da Terra se preparava para divulgar o relatório
Vinícius Mansur
Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ)
Enquanto a Comissão Pastoral da Terra (CPT) se preparava para divulgar, nesta segunda-feira (16), os números de assassinatos por conflitos no campo no Brasil em 2017, mais um corpo foi encontrado.
No último domingo (15), o líder quilombola Nazildo dos Santos Brito, 33 anos, foi encontrado morto com tiros na cabeça e na costela, na Comunidade de Remanescentes de Quilombo Turê III, na divisa dos municípios de Tomé-Açu e Acará, no nordeste do Pará.
A polícia investiga o caso e suspeita que o crime tenha motivação política. Nazildo era ameaçado de morte por denunciar crimes ambientais.
Aumentam as mortes
Os dados da CPT, divulgados nesta segunda-feira (16), demonstram que essa realidade só se agrava desde 2013, quando foram registrados 34 assassinatos. Em 2017, esses números cresceram 105%, chegando a 70 execuções.
Em comparação com 2016, houve crescimento de 16%. Os dados ainda podem ser ainda piores, já que as mortes de 10 indígenas isolados do Vale do Javari (AM), em julho e agosto de 2017, ainda não foram confirmadas como assassinatos pelo Ministério Público Federal do Amazonas e Fundação Nacional do Índio (Funai).O coordenador nacional da CPT, Ruben Siqueira, destaca que a violência no campo brasileiro é uma constante, conforme demonstram os levantamentos que a entidade faz desde 1985.
Ofensiva empresarial
Siqueira avalia que a curva ascendente de assassinatos a partir de 2013 está relacionada com a ofensiva empresarial por terras no Brasil. “A gente está interpretando como uma nova corrida à terra. A terra como meio de produção, como reserva de valor, como madeira, água, minério, possibilidades de agronegócio, de expansão do negócio em torno da terra. Isso tem a ver com a crise econômica, cuja origem em 2008 foi o estouro da bolha especulativa. De lá pra cá, eles, o setor hegemônico do capitalismo hoje, que é o capital financeiro, procura um lastro, uma base que dê um mínimo de garantia para essa banca do jogo internacional de especulação”, analisa.
Entre os mortos computados pela CPT estão trabalhadores rurais sem-terra, indígenas, quilombolas, posseiros, pescadores e assentados da reforma agrária. O estado do Pará lidera o ranking com 21 pessoas assassinadas em 2017. Em segundo vem Rondônia, com 17, seguido por Bahia, com 10, e Mato Grosso, com 9.
O levantamento da CPT também chama atenção para o retorno dos massacres. Em 2017, foram registrados quatro, que resultaram em 28 mortes ou 40% do total daquele ano. Eles aconteceram em Colniza (MT), Vilhena (RO), Pau D`Arco (PA) e Lençóis (BA).
Siqueira afirma que a CPT não registrava um número tão grande de assassinatos em escala desde 1987, quando foram registrados seis massacres.
Licença para matar
Em 2016, por exemplo, nenhum crime deste tipo ocorreu. A CPT classifica como massacres os casos em que pelo menos 3 pessoas são mortas, na mesma ocasião e pelos mesmos motivos.
“A volta e a grande incidência desse número, 28 massacrados em quatro chacinas, têm a ver com esse clima que nós vivemos no país de que tudo é possível. Ou Estado está ausente, ou ele é indutor de uma liberdade, que não é liberdade, na verdade, é uma licença para matar e fazer o que quiser”, opinou Siqueira.
Os registros feitos pela CPT desde 1985 apontam a ocorrência de 1.438 casos de conflito no campo que deixaram 1.904 vítimas até 2017. Destes, apenas 113 foram julgados, o que corresponde a 8% dos casos.
Ruben Siqueira informou, ainda, que os dados completos do relatório Conflitos no Campo Brasil 2017 não puderam ser lançados nesta semana, em que se comemora o Dia Internacional de Luta Camponesa, porque os servidores da CPT foram atacados por hackers no final do ano passado. A Polícia Federal está investigando o caso e o relatório completo deverá ser lançado no próximo mês.
Edição: Katarine Flor