Por Roberto Carlos Oliveira de Andrade
A cidade é um autêntico palco de conflitos sociais, políticos e ideológicos.
Com o passar dos anos, vemos esses conflitos implicarem aglomerações urbanas cada vez mais arruinada espacialmente. As políticas urbanas que deveriam combater essas mazelas na cidade, são colocadas de lado. Isto é, ao invés do poder público, entidades civis e a sociedade organizada juntos, minimizarem este arruinamento, presenciamos o poder público ausente, entidades omissas e uma sociedade cada vez mais egoísta.
Políticas urbanas é oriunda Lei nº 10.257 de 10 de junho de 2001 – que trata o Estatuto da Cidade -, e o Estatuto da Cidade por sua vez, nasce a partir da Constituição Federal. Em ambas, há tratamentos para os Instrumentos de Políticas Urbanas. Neste artigo, falarei sobre este tema porque são recursos que têm objetivo de minimizar os conflitos da conjuntura urbana. Contudo, o que é, qual seu objetivo e como são aplicados os Instrumentos de Políticas Urbanas?
Antes, vale ressaltar que o Estatuto da Cidade surgi a partir dos Artigos 182 e 183 da Constituição Federal. Esses artigos referem-se: i) política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal […] e, ii) o detentor de área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados […] utilizando-a para sua moradia ou de sua família, terá o domínio, desde que não tenha outro imóvel urbano ou rural registrado [1].
Além de estar incumbida de promover o bem-estar social de seus habitantes, a Política Urbana é uma norma de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. Tem por objetivo ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, através do direito à moradia, à infraestrutura urbana, […] ao lazer, para as presentes e futuras gerações [2].
Os Instrumentos da Política Urbana são divididos em: i) os planos nacionais, regionais e estaduais; ii) planejamento das regiões metropolitanas; iii) planejamento municipal; iv) institutos tributários e financeiros; v) institutos jurídicos e políticos e; vi) estudo prévio de impacto ambiental e estudo prévio de impacto de vizinhança [2]. Esses 6 instrumentos tem a função de promover políticas públicas a fim de, ordenar, planejar e conciliar os intermitentes conflitos que ainda imperam na cidade desde o período colonial.
Fazendo uma co-relação entre o Artigo 182º da Constituição Federal e o Estatuto da Cidade, percebemos estes Instrumentos assemelham-se com o termo ‘Welfare State’ ou o estado de bem-estar social. Todavia, é preciso esclarecer, que os serviços de Welfare State são de caráter público e reconhecidos como direitos sociais [3]. Isto é, o Estado assistencial que garante padrões mínimos de educação, saúde, habitação, renda e seguridade social a todos os cidadãos tal como estabelecido nas Leis, anteriormente citadas.
Contudo, quando analiso essas políticas urbanas e remeto à cidade de Porto Velho (RO), é notório que o executivo municipal, além de não primar pela aplicação dos Instrumentos de Políticas Urbanas, vêm dando atendimento drasticamente díspares, principalmente quanto à infraestrutura urbana. Vêm priorizando regiões centrais ante a regiões periféricas. Enquanto temos uma rua sendo reasfaltada na região central – beneficiando uma pequena parte da cidade de uso predominantemente comercial – outras, com menos extensão, poderiam estar recebendo essa mesma benfeitoria. Todavia, a vantagem é que, se tratando de uma região periférica que não tenha obtido o asfaltamento por exemplo, além da melhoria na circulação de pedestre ou veicular, essa região periférica certamente sofreria menos com ruas alagadas e empoeiradas, nos períodos chuvosos e secos, respectivamente, o que favoreceria um maior número de pessoas que na região central.
Em outra grave ausência do município nas políticas urbanas, estão as beiras de córregos, rios e áreas alagáveis – por terem legislação específica -, além de estarem em condições vulneráreis, são áreas que tendem a acumular mais moradias. Esse contexto, pode ser presenciado em Porto Velho (RO) nos igarapés Grande (bairro Nova Floresta ao Tucumanzal), Gurgel (bairro Cohab), Santa Bárbara (no Mocambo) e canal Tancredo Neves (bairro Lagoinha). As consequências dessas precárias habitações são: contaminação do lençol freático, poluição dos recursos hídricos e dos mananciais, mortes por desmoronamento, epidemias etc.
Diante dessa realidade, vimos que, os Instrumentos de Políticas Urbanas para esta cidade são propostas com poucas obras de inclusão social, seguido de interesses do capital imobiliário. Uma herança desde sua urbanização do estilo coronelismo de ser, que governa para minoria e exclui a maioria numa verdadeira relação de política do favor, implicando numa situação anárquica e subversiva para o crescimento sustentável da cidade [4].
Em síntese, sabendo que o Estatuto da Cidade tem objetivo de promover o bem-estar social para seus munícipes, contudo, vimos seus Instrumentos de Políticas Urbanas, completamente enferrujados e ou sem tocar uma canção qualquer. E quando esses instrumentos tocam, os acordes soam desafinados aos ouvidos mais aguçados da periferia. Por fim, deixo uma pergunta para reflexão: o que podemos contribuir para que nossos Instrumentos de Políticas Urbanas venham se concretizar numa orquestra sinfônica audível?
Referências:
[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Arts. 182 e 183.
[2] _________. (2001) Lei 10.257 de 10 de julho de 2001: Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Brasília: Congresso Nacional, p. 10 e 11.
[3] https://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/estado-do-bem-estar-social-historia-e-crise-do-welfare-state.htm (acessado em 21/04/2018 as 10h).
[4] MARICATO, Hermínia. Para entender a crise urbana. São Paulo/SP, 2015, p. 87 e 16.
* Arquiteto, urbanista e professor universitário. Contato: robertoandradebr@gmail.com