Mulheres negras ou pardas são apenas 28,3% das prefeitas eleitas em 2016. Em relação ao total de prefeitos (homens e mulheres), o percentual cai para 3,29%. É o que revela o “Mapa Étnico Racial das Mulheres na Política Local Brasileira”, elaborado pela CNM (Confederação Nacional de Municípios) e obtido com exclusividade pelo HuffPost Brasil. O levantamento publicado nesta quarta-feira (25), Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha, reflete as barreiras de representatividade de gênero e raça no País.
Das 649 prefeitas eleitas para 5.568 municípios, 459 se declararam brancas (70,7%), 174 pardas (26,8%), 10 negras (1,5%), 5 amarelas (0,7%). Apenas a chefe do Executivo em Marcação, na Paraíba, Eliselma Silva de Oliveira (PDT), se declarou indígena.
Em comparação com a população brasileira, a investigação étnico racial do censo de 2010 do IBGE mostrou que 7,6% da população brasileira se considera preta e 43,1% se considera parda, somando 50,7% do total.
A representatividade racial entre as mulheres muda de acordo com a região. No Norte, há maior predominância de negras e pardas (46,2%), seguida pelo Nordeste (38,2%), Centro Oeste (33,3%), Sudeste (13,5%) e Sul (5,7%). Quanto aos estados, na Bahia há maior número absoluto de mulheres pardas (23) no poder, mas nenhuma prefeita se declarou negra. Em seguida vem o Maranhão, com 2 prefeitas pretas e 20 pardas; e Minas Gerais, com 2 pretas e 15 pardas.
A pesquisa destaca o papel de estereótipos nesse contexto e afirma que frequentemente partidos e o próprio eleitorado tendem a associar competência política ao perfil masculino, branco, heterossexual, casado e de boa posição socioeconômica. “A participação de mulheres negras na política nacional e subnacional ainda é extremamente reduzida, assim como a de indígenas. Sobre essas mulheres incide uma dupla discriminação, a racista e a sexista”, diz o Mapa.
Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha
Lembrado em 25 de julho, o Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha foi criado no primeiro Encontro de Mulheres Negras Latinas e Caribenhas, em 1992, na República Dominicana, onde foram discutidas questões sobre racismo e machismo.
A data foi reconhecida pela ONU naquele mesmo ano. No Brasil, desde 2014, comemora-se conjuntamente o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, uma homenagem à líder quilombola do Mato Grosso. No século XVIII, ela se tornou a rainha do quilombo do Quariterê e coordenou desde a criação de um parlamento local à organizar da colheita e produção de armas.
Para chegar a esses números, o Movimento Mulheres Municipalistas (MMM), criado pela CNM em 2017 cruzou bases de dados dos registros de candidatos e eleitos a prefeitos e vereadores, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), referentes às eleições municipais de 2016. Os candidatos fazem uma autodeclaração racial à Justiça Eleitoral.
Segundo o estudo, menor acesso aos recursos partidários e a falta de uma legislação sobre aspectos etnicos no âmbito eleitoral são fatores que levam a esse cenário. De acordo com a Lei das Eleições, pelo menos 30% das candidaturas de cada sigla deve ser de um dos gêneros, mas não há cotas para candidatos negros.
Uma consulta protocolada em junho no TSE pede que metade da cota do Fundo Eleitoral e do tempo de propaganda eleitoral estabelecida para candidaturas femininas seja destinada a mulheres negras.
Em maio, o TSE determinou que 30% dos recursos do Fundo Eleitoral devem ser gastos em campanhas de mulheres, em resposta a uma consulta da bancada feminina. Em março, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu no mesmo sentido sobre o Fundo Partidário, com base no percentual de cota de candidaturas por gênero.
Sem Marielle Franco, há 328 vereadoras negras
No Legislativo local, mulheres negras têm uma representatividade um pouco mais expressiva. Dentre as vereadoras atualmente no poder, 36,7% são negras (32,5% autodeclaradas como pardas e 4,21% como pretas). As brancas representam 62,4%, as amarelas 0,4% e as indígenas 0,2%. “O percentual de mulheres negras como vereadoras é 8,4% maior em relação às prefeitas”, destaca o estudo.
Em números absolutos, das 7.808 vereadoras, 2.543 se declararam pardas. O número de negras, por sua vez, caiu de 329 para 328, com a morte de Marielle Franco (PSol) em 14 de março. Mulher negra, nascida na Favela da Maré, lésbica e defensora dos direitos humanos, Marielle foi a 5ª vereadora mais votada do Rio em 2016.
Apesar do cenário um pouco melhor do que o do Executivo, comparado ao universo total de prefeitos, contudo, o percentual ainda é baixo. Dos 57.419 vereadores, as mulheres são 13,6%. Já as mulheres negras são cerca de 5% nas câmaras municipais.
Nas regiões, a distribuição se repete. O Norte possui uma forte presença de vereadoras negras, com 67,6% do total de eleitas nessa região (60,3% de pardas e 7,3% de pretas). Em seguida, aparece Nordeste (56%), Centro Oeste (41,2%), Sudeste (23,6%) e Sul (4,3%). Nos estados, a Bahia também se destaca, com 53 vereadoras negras e 322 pardas.
O estudo afirma que só há um quadro positivo entre as vereadoras nas regiões Norte e Nordeste e defende o planejamento de ações afirmativas para a busca da equidade de gênero e raça na política. “Mesmo com a criação das cotas para candidatas mulheres, a presença delas nos espaços de poder local, estadual e federal, continua crescendo a passos demasiadamente lentos. Além disso, como vimos no presente mapeamento, a política local ainda continua sendo um espaço de pessoas brancas”, diz a pesquisa.