A Comissão Pastoral da Terra Regional Rondônia repudia a ação violenta da Polícia Militar de Guajará-Mirim (RO), que resultou na morte de dois trabalhadores rurais e um ferido, além da morte de um policial do Grupo de Operações Especiais (GOE).
Constatamos que a ação foi ilegal, pelo fato de que, seja qual for a origem de possível autorização da ação policial, esta não cumpriu nenhum dos requisitos legais de reintegração de posse: não havia oficial de justiça nem presença de setores de apoio (ambulância, assistência social, etc); aconteceu sem mandado judicial, no fim da tarde e os policiais chegaram sem anúncio formal da ação, surpreendendo os trabalhadores acampados com tiros.
A CPT, acompanhada da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RO, organizou visitas no local dos fatos (Distrito de Nova Dimensão, região de Nova Mamoré), acompanhados também por lideranças locais e, a partir da escuta dos depoimentos dos trabalhadores, relatamos o seguinte:
O conflito acontecido no dia 25 de julho na linha 29 deste distrito (KM 42) envolvendo 105 famílias de um acampamento sem-terra em área pública da União resultou na morte de dois trabalhadores sem-terra, TIAGO CAMPIN DOS SANTOS de 23 anos, que deixou a esposa grávida de oito meses; ADEMAR FERREIRA, 24 anos, que deixou esposa e dois filhos; resultou, ainda, na morte de um policial, JOÃO BATISTA DA COSTA FILHO, em um sem-terra baleado que conseguiu fugir do local e foi socorrido e se encontra hospitalizado;
Existem versões diferentes da Polícia Militar para o acontecido; a versão inicial fala de uma atuação por denúncia de fogo e queimadas; a outra versão – na mídia – é de que a Polícia cumpria uma reintegração de posse; estas versões precisam ser investigadas porque a desinformação compromete a apuração dos fatos e promove a impunidade. Além disso, o Cel. da PM de Guajará Mirim relata em vídeo divulgado na imprensa que as pessoas assassinadas eram bandidos, quando na verdade sequer possuem passagem pela polícia;
Os trabalhadores rurais estão nessa região (105 famílias) há três anos com diversos eventos de violência e despejo (em abril de 2016 houve uma reintegração de posse); todas estas situações foram plenamente notificadas às autoridades (INCRA, MP, governos, polícias etc) sem a devida atenção e sem a tomada de providências que poderiam ter evitado o conflito e as mortes;
Segundo os camponeses esta área em disputa é pública da União Federal, grilada pelo Sr. Jorge Bispo, que também estaria envolvido com a extração ilegal de madeira, e que mantém uma forte presença de milícias armadas no local;
os camponeses relatam que haviam acordos informais que garantiam a presença das famílias na terra enquanto negociavam com o INCRA, mas estes acordos dependiam de difíceis relações entre grileiro, serrarias e milícias e eram abruptamente rompidos com eventos de perseguição e violência;
Os trabalhadores notificaram estas situações para órgãos de segurança e governo, inclusive os encaminhamentos de uma reunião na Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa, no início deste ano, em que todos os aspectos foram levantados e registrados demandando providências (existem documentos, protocolos, vídeos e fotos).
Diante desse episódio e tantos outros casos de assassinatos relacionados a conflitos agrários no estado, exigimos:
Que o INCRA imediatamente indique local para estas famílias, com criação de condições de moradia provisória e alimentação, bem como informe sobre a situação jurídica da área;
Garantia de vida e proteção para o trabalhador hospitalizado com pleno direito de defesa;
Que a SEDAM e órgãos competentes intervenham na situação de “manejo” irregular na região, bem como esclareçam publicamente sobre o envolvimento de servidores do órgão;
Investigação isenta e ágil de todas as mortes com pleno direito de defesa.
CPT Rondônia
Porto Velho (RO), 31 de julho de 2018