Por Gustavo Bitencourt – Primeiro, antes de mais nada, esqueçam essa narrativa da campanha pobrinha que se sustentou coitada só de whatsapp, 8 segundos de TV e antipetismo. É mentira.
Foi um projeto multibilionário, envolvendo diversas corporações estrangeiras e nacionais, arquitetado há muito tempo, pra rifar nossa mão de obra e recursos a preço de fim de feira. O Bolsonaro foi só o cara que tava na mídia no momento certo pra vender a imagem do antiherói reacionário que o povo brasileiro tava querendo comprar. O jogo já vinha de bem antes. É gente que elegeu o Trump, é gente que tá financiando a ascenção da extrema direita na Europa. São corporações imensas que pobre não tem nem acesso a saber o nome.
Se o Ciro fosse o candidato do PT, ele perderia a vantagem que ele teve, que era a de não ser PT. Isso sem a única vantagem que o PT tinha nessas eleições, que é justamente ser o PT e ter uma base popular, ter estrutura, ter influência, histórico. Não foi o PT e não foi o Ciro que elegeram o Bolsonaro. Não foi a falta nem o atraso do apoio da Marina.
Nossa esquerda e centro-esquerda ofereceram a resistência que podiam, mas não tinham bala na agulha pra isso. Foi uma guerra principalmente de informação, e a gente não tinha tecnologia, nem estratégia nem volume pra lidar com um troço desse tamanho. Eles construíram um mecanismo extremamente inteligente que tornaria qualquer coisa capitalizável. Se você ataca funciona pra eles, se você recua, se você fala a verdade, se você mente, se você apela pra baixaria, se você tenta manter a dignidade, tudo funciona pra eles.
Pra vocês terem uma ideia de como funciona o bagulho, o Maduro acabou de publicar uma nota sobre as eleições aqui falando em manter as relações com Brasil. No twitter várias contas robô apoiando a ideia “muito bem, presidente, mal foi eleito já está restaurando a diplomacia”. O Maduro, ok? Da Venezuela. Aquele país que justificava odiar o PT porque Venezuela. Pois bem.
A gente tava tão cercado que não tinha o que fazer. Essas peças foram sendo colocadas aí aos poucos, a gente nem viu. A gente via uma, corria atrás daquela, eles colocavam outras duas do outro lado. Enquanto a gente tava correndo atrás de desmentir o kit gay, eles tavam criando escola sem partido, minando a universidade pública. Enquanto a gente tava preocupado com o impeachment, eles tavam já tinham todas as diretrizes da reforma trabalhista, aprovaram uma lei antiterrorismo que o candidato já usou pra nos ameaçar agora. Percebam que eu não to falando só da campanha, to falando de muito antes, uns cinco, seis anos pelo menos, provavelmente mais.
Era uma hidra, que você corta uma cabeça, nascem duas. Não tinha pra ninguém. Lutamos bem, fizemos bonito, se parabenizem. Não to falando agora dos partidos e dos candidatos, embora eu tenha achado legal também ver gente do PT, PCdoB, PSOL, PDT, Rede se unindo (PSDB sempre vai ser demais pra mim, sinto muito). Mas eu to falando da gente, do povo mesmo, da classe média do bolo e cafezinho, das professoras e professores das capitais e do interior que tavam aí tentando abrir a cabeça das pessoas, dos artistas, dos jornalistas que começaram a se posicionar como jornalistas na hora que começaram a perceber o tamanho da treta, aos sobreviventes da ditadura que levantaram a voz, da empregada, da moça do balcão da padaria que teve coragem de ir pro trabalho com um adesivo de estrela no peito, as pessoas que fizeram qualquer tipo de resistência em qualquer lugar, qualquer área.
O que nos resta é juntar quem tiver e fazer a oposição mais ferrenha possível e barrar cada tentativa, cada ataque ao que foi conquistado. Vão ser muitos. E não só ficar reagindo aos ataques, aprender a atacar também, em muitos pontos diferentes, ao mesmo tempo. Uma hora acha uma brecha. Se antecipar, enxergar o que pode acontecer daqui a um ano, cinco, dez.
E não entrar na pira do terror. Não pode. Se informar sim, alertar sim, criar meios de se proteger sim, mas nunca, nunca deixar essa gente nos acuar. Cuidar com informações que podem gerar terror, confirmar mil vezes, cuidar em como passa pra frente.