A lambança na demissão do ministro dos laranjais foi a gota d´água.
Nenhuma surpresa. Acabou precocemente o governo do clã dos Bolsonaros, aos 50 dias de vida, na primeira crise que enfrentou.
Por Ricardo Kotscho
A deprimente imagem do vídeo improvisado em que o presidente Jair Bolsonaro se rende à chantagem de Bebianno, e o cobre de elogios, deve ter arrepiado o brio até dos militares mais insensíveis.
Começa agora para valer o governo da junta militar comandada pelo general Augusto Heleno, o chefe da “turma do Haiti”.
Com a nomeação do general Floriano Peixoto para o lugar do defenestrado Gustavo Bebianno na Secretaria-Geral da Presidência, completa-se o quadro dos militares que estiveram nos últimos anos no Haiti liderando a tropa de paz da ONU.
Faz parte do grupo também o general da ativa Otávio do Rêgo Barros, o porta-voz sempre assustado.
O Haiti está em guerra civil outra vez, com o país em frangalhos e morrendo de fome, mas os generais se deram bem.
Ganharam para comandar, com a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, um país bem maior, o Brasil.
Nem na época dos generais presidentes da ditadura eles tiveram tanto protagonismo no Palácio do Planalto.
Afinal, o presidente capitão e o vice general também são militares.
Já são quatro generais no centro do poder, além de Mourão, oito militares no ministério e ao todo 46 fardados ou ex-fardados no primeiro e segundo escalões do governo.
Até os militares que ainda não estão no governo já se sentem incomodados com esta escalada de generais no governo Bolsonaro, como mostra a reportagem “Ala militar comemora poder, mas se preocupa com o destaque excessivo”, de Igor Gielow, publicada na Folha desta terça-feira.
Relata a abertura da matéria:
“Se por um lado está sendo comemorada pelo núcleo militar como a consolidação do seu poder no centro do governo Jair Bolsonaro, a chegada do oitavo ministro egresso das Forças Armadas já começa a despertar algumas preocupações.
A principal, ouvida pela Folha de diversos oficiais generais ao longo da agônica demissão de Gustavo Bebianno da Secretaria-Geral, diz respeito ao óbvio: os filhos de Bolsonaro continuarão a ser instrumentos de interferência no governo?”
Como não dá para demitir os filhos nem o vice, inimigo deles, tudo indica que sim.
Bebianno e os filhos 01, 02 e 03 sumiram de cena de um dia para outro, mas a crise de autoridade deflagrada pelos próprios Bolsonaros está longe de acabar.
Mais do que nunca, a sobrevivência do capitão está nas mãos dos generais da “turma do Haiti” liderados pelo conselheiro Heleno Fragoso, chefe do GSI.
“Hoje, a ala militar tem um Estado-Maior em formação na administração, com secretarias, estatais e cargos diversos. Só que esse tipo de órgão assessora e aconselha um líder, e o episódio Bebianno jogou dúvidas entre vários oficiais sobre a capacidade de comando do presidente logo na sua primeira crise política”, escreve Gielow.
O clima de desconfiança entre os diferentes atores desta pantomina institucional é tão grave que até nas reuniões entre eles os celulares estão sendo deixados do lado de fora da sala.
É nesse cenário que o governo entrega esta semana à Câmara seus dois mais importantes e, ao que tudo indica, únicos projetos de governo: o pacote anticrime de Moro e a reforma da Previdência de Guedes, os únicos civis que se sobressaem em meio ao batalhão de generais.
A reforma da Previdência é tratada como a salvação da lavoura, a bala de prata do governo para agradar o mercado e a mídia.
E se o tiro sair pela culatra, com esta base aliada mambembe, o que a junta militar poderá fazer?
Cercar o Congresso com tanques, como os militares já fizeram em outros tristes tempos? Ou mandar um soldado e um cabo ocupar o STF, como sugeriu o filho 03?
Em seu 50ª dia de governo, Bolsonaro já virou um 00 à esquerda, que nem sabe o que ainda está fazendo no governo.
A distinta platéia que o elegeu a tudo assiste bestificada.
Foi para isso, devem pensar, que batemos panelas, marchamos contra a corrupção, derrubamos a Dilma, prendemos o Lula e engordamos os patos amarelos na avenida Paulista?
Vida que segue.