Ricardo Kotscho analisa o novo escândalo do clã Bolsonaro, que nomeou 102 pessoas com laços familiares para cargos públicos em 28 anos: “Se antes de chegar ao Palácio do Planalto, o clã já tinha essa tropa de assessores aparentados, pode-se imaginar o que está fazendo com a caneta Bic na mão, em Brasília”.
Por Ricardo Kotscho, para o Balaio do Kostscho e para o Jornalistas pela Democracia
Podem reparar: já contaram quantas vezes se cita a palavra “normalizar” ao comentar as barbaridades cometidas pela familícia Bolsonaro em sete meses de governo?
Tudo agora é “normalizado” no dia seguinte, como se os maiores absurdos e crimes cometidos contra a soberania nacional e as instituições fossem coisas da vida.
“Pessoal, problemas acontecem, está certo?”, disse o próprio Jair, o chefe do clã, ao comentar esta semana o massacre em que morreram 62 presos no Pará.
As coisas agora simplesmente “acontecem”, não há responsáveis, e logo aparecem os analistas para “passar o pano”, e vida que segue.
“Normalizar” e “passar o pano” são, desde já, minhas candidatas a palavras do ano, que concorrem com a onipresente “tosco” para definir o inominável que governa o país.
A gente tenta, mas está difícil mudar de assunto, como propõe o Antonio Prata, em sua coluna deste domingo na Folha.
Ainda não cheguei ao ponto do colega, que receitou até rivotril com rabo de galo para enfrentar essa barra, num texto ficcional, em que só se refere ao capitão como B., para não citar o nome.
Pois a familícia de B. está hoje na manchete do jornal “O Globo”, o que não nos deixa falar de outra coisa:
“Em 28 anos, clã Bolsonaro nomeou 102 pessoas com laços familiares”.
No total, a reportagem do Globo identificou 286 assessores nomeados nos quatro gabinetes de Jair, Carlos, Flavio e Eduardo Bolsonaro.
Todos, é claro, pagos com dinheiro público, ou seja, com o nosso dinheiro.
Esse é o esquema da “nova política” que levou os Bolsonaros e mais um monte de cacarecos ao governo que está destruindo o país como se fosse um exército de ocupação.
Esse batalhão de aspones foi nomeado, não para prestar serviço público, pois muitos deles nem chegaram a trabalhar em seus cargos, mas para participar do esquema de “rachadinha” que alimentou os cofres dos maganos da moralidade que vieram para combater a corrupção da “velha política”.
Agora se entende a ofensiva do governo bolsonariano contra o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras), que quebrou o sigilo de 64 dos 286 funcionários nomeados pelo clã da familícia.
Só o agora famoso Fabrício Queiroz, super assessor do pai, dos filhos e do espírito santo, teve uma “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017.
Nas investigações, apareceu até um cheque para a primeira dama Michelle _ segundo Jair, parte do pagamento de uma dívida.
O Coaf também identificou depósitos fracionados, em dinheiro, no período de um mês, no valor de R$ 96 mil na conta do deputado Flávio Bolsonaro, hoje senador.
Tudo isso já foi “normalizado”, inclusive pelo presidente do STF, Dias Toffoli. No mês passado, ele mandou suspender as investigações sobre Flávio Bolsonaro.
Os advogados de defesa do clã e o Palácio do Planalto não quiseram se pronunciar sobre a matéria.
Se antes de chegar ao Palácio do Planalto, o clã já tinha essa tropa de assessores aparentados, pode-se imaginar o que está fazendo com a caneta Bic na mão, em Brasília.
Deram-se bem também os militares reformados, como Jair Bolsonaro, como os generais de pijama ocupando cargos em toda a estrutura do governo, com direito a receber dois salários por mês.
Em qualquer país civilizado, essa grande maracutaia já teria provocado comissões de inquérito no parlamento e rebeliões nas ruas, mas aqui já foi tudo “normalizado”.
Amanhã não se fala mais nisso.
Vida que segue.