‘Vi até boi em reserva biológica’, diz ambientalista

‘Vi até boi em reserva biológica’, diz ambientalista

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Danicley de Aguiar, membro da Campanha da Amazônia do Greenpeace, diz que combater o desmatamento não é especialidade das Forças Armadas e pede fortalecimento do Ibama

O Globo

RIO — Embora esteja familiarizado com o desmatamento na região, Danicley de Aguiar, de 44 anos, sofreu um choque na última sexta-feira, quando viu, em um sobrevoo, o tamanho e a expansão das queimadas em Altamira e Novo Progresso, ambas no Pará. Natural de Santarém, no Sul do estado, o membro da Campanha da Amazônia do Greenpeace combate a visão que, segundo ele, predomina sobre os proprietários rurais da Amazônia, que relacionam desenvolvimento a devastação.

Em um município tão grande como Altamira, é possível combater eficazmente o desmatamento?

Sim, desde que haja estratégia. Nos últimos anos, houve uma queda de 50% no número de operações de Ibama. Comando e controle não resolvem tudo, mas são o primeiro passo para garantir a ordem e o desenvolvimento. O grupo especializado de fiscalização do instituto ainda não foi acionado este ano. É um dado que revela o quanto o governo foi distraído com o problema.

O que o senhor viu no sobrevoo?

Vi até boi em reserva biológica. Nem podemos culpar a estiagem pelo incêndio, porque choveu enquanto eu sobrevoava a BR 163. É mais grave do que a queimada, é um sinal de avanço da agropecuária. O governo promoveu um desmonte da política ambiental, enfraqueceu o Ibama. Agora, está colhendo o que plantou.

Qual é a sua opinião sobre a atuação das Forças Armadas na Amazônia?

Entendo que ninguém no Brasil, nenhuma força, tem mais expertise do que o Ibama no combate e no controle do desmatamento. A resposta mais correta seria pôr o Ibama na região, organizar as operações, colocar recursos à disposição. Combater o desmatamento não é a especialidade das Forças Armadas. Elas podem auxiliar o Ibama, não vejo problemas, mas a coordenação do processo deve ser do instituto. Para isso ele foi criado para garantir a proteção de nossas florestas. Se não for fortalecido ainda mais, será barbárie total.

No início do mês, fazendeiros atearam fogo em suas propriedades para dar uma demonstração de apoio ao presidente Jair Bolsonaro. Como a população em Altamira vê uma manifestação como essa?

Na Amazônia, crescemos ouvindo que é preciso desmatar para sobreviver. É uma retórica falsa que se perpetuou por décadas. Foi assim nos anos 1970, com a criação da Transamazônica. Depois veio o mesmo com o avanço da soja, a chegada da BR-163, a construção da usina de Belo Monte. E não houve efeito — já desmatamos 20% da área original da floresta, e a qualidade de vida da população ainda é baixa.

Como promover o desenvolvimento econômico da Amazônia?

Nunca tivemos um plano que conciliasse desenvolvimento com a floresta. Pelo contrário, ela sempre foi vista como obstáculo. Mas ainda dá tempo de mudar esta mentalidade. Até mesmo o cenário que vi do helicóptero. Mesmo a situação de Altamira, agora tão devastada, pode ser revertida.

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