PSOL, Rede e PT protocolaram representação nesta quarta-feira e apontam quebra de decoro por parte do senador
Daniel Carvalho
Folha
Os partidos de oposição PSOL, Rede e PT protocolaram nesta quarta-feira (19), no Conselho de Ética no Senado, uma representação em que pedem a cassação do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) por quebra de decoro parlamentar.
As legendas indicam como motivação a ligação do filho do presidente Jair Bolsonarocom milicianos, a investigação sobre se houve “rachadinha” —esquema em que funcionários são coagidos a devolver parte de seus salários— no gabinete de Flávio, quando ele era deputado estadual no Rio de Janeiro, e a contratação de funcionários fantasmas neste mesmo período.
Na representação, os partidos dizem acreditar que a cassação é possível mesmo que as justificativas apontadas tenham ocorrido antes de Flávio ter tomado posse como senador.
“É possível a cassação de parlamentar que tenha praticado ato indecoroso antes do início do mandato, condicionando-a, contudo, à constatação de que a conduta anterior fosse desconhecida. Os fatos vieram a lume após a eleição de Flávio Bolsonaro ao Senado Federal: o conhecimento público do relatório do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] é de dezembro de 2018 e as conclusões do MP/RJ [Ministério Público do Rio de Janeiro], de dezembro de 2019”, diz trecho da representação.
Também foi pedido o afastamento temporário de Flávio do cargo de terceiro secretário da Mesa Diretora do Senado.
“A permanência do representado em cargo na Mesa possibilita a retirada da essencial higidez e imparcialidade do processo, vez que potencializa a ocorrência de interferências do processado”, diz o texto.
O Conselho de Ética do Senado tem vagas para 15 titulares e 15 suplentes —nem todos os integrantes foram indicados ainda. É presidido pelo senador Jayme Campos (DEM-MT), aliado do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que costuma evitar embates com o governo.
O colegiado reuniu-se apenas uma vez nesta legislatura, em setembro do ano passado. Entre os titulares da comissão de perfil mais declaradamente governista estão o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), e o senador Chico Rodrigues (DEM-RR).
Iniciado o processo, o conselho fará diligências que julgar necessárias ou que forem requeridas por quem apresentou a denúncia ou para o alvo da representação, bem como pelo relator e demais membros da comissão. O conselho pode convocar o representado e testemunhas para depoimento presencial.
Produzidas as provas, o relator declarará encerrada a instrução, intimará o representado ou denunciado para apresentar suas alegações finais no prazo de três dias úteis e, após isso, entregará relatório que será apreciado pelo conselho no prazo de dez dias úteis.
O parecer poderá concluir pela procedência da representação ou pelo seu arquivamento, oferecendo-se, na primeira hipótese, o projeto de resolução apropriado para a declaração da perda do mandato.
As medidas disciplinares vão desde uma advertência até a perda de mandato. A perda do mandato será decidida pelo plenário, em votação secreta e por maioria absoluta de votos.
As suspeitas contra Flávio e o ex-policial militar Fabrício Queiroz tornaram-se o principal motivo de dor de cabeça do presidente Jair Bolsonaro desde sua eleição.
Em dezembro de 2019, os dois foram alvo de operação comandada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
Agentes foram a endereços de Queiroz e de outros ex-assessores de Flávio. Na lista estão parentes de Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente.
A suspeita do Ministério Público é que Queiroz operava no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio um esquema de “rachadinha”. O filho de Bolsonaro foi deputado estadual de fevereiro de 2003 a janeiro de 2019.
A Promotoria acredita ainda que Flávio lavou cerca de R$ 2,3 milhões obtidos no esquema por meio de uma loja de chocolates e de negociações de imóveis.
Além disso, há outra complicação na vida de Flávio: sua relação com o ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, morto na Bahia.
Acusado de integrar uma milícia, ele já acumulava 29 dias de detenções administrativas pela Polícia Militar em junho de 2005, quando foi homenageado na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) por Flávio a pedido de seu pai.
O ex-PM, expulso da corporação em 2014 por envolvimento com o jogo do bicho, já havia sofrido três punições administrativas —duas consideradas leves e uma média— quando recebeu a medalha. Nenhuma delas se refere à acusação de homicídio que respondia na Justiça quando foi condecorado por Flávio.
Quando o então deputado estadual propôs a homenagem, Adriano estava preso sob suspeita de matar o guardador de carros Leandro dos Santos Silva, 24, assassinado em novembro de 2003.
O então policial chegou a ser condenado no Tribunal do Júri em outubro de 2005, mas conseguiu recurso para ter um novo julgamento, foi solto em 2006 e absolvido no ano seguinte.
O ex-policial foi citado na investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro que apura se houve “rachadinha” no gabinete de Flávio quando ele era deputado estadual.
Segundo o MP-RJ, contas de Adriano foram usadas para transferir dinheiro a Fabrício Queiroz, então assessor de Flávio e suspeito de comandar o esquema de devolução de salários.
Queiroz e Adriano trabalharam juntos no 18º Batalhão da PM. Foi por meio de Queiroz que familiares do ex-PM foram contratadas como assessoras no gabinete de Flávio: sua ex-mulher, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, de 2007 até novembro de 2018, e sua mãe, Raimunda Veras Magalhães, de abril de 2016 a novembro de 2018.
Após mais de um ano foragido, o ex-PM foi morto numa operação policial comandada pela Secretaria de Segurança da Bahia. A polícia investiga as circunstâncias da morte. Seu advogado, Paulo Emilio Catta Preta, afirma que ele temia ser alvo de uma “queima de arquivo”.
Flávio manifestou-se sobre a representação em um comentário de rede social.
“Essa representação dos defensores de bandido condenado em 2ª instância (PT/pÇoU/REDE) não serve nem para limpar o furo!”, escreveu Flávio Bolsonaro.