Ele faleceu em junho de 2019 aos 83 anos como Arcebispo Emérito da Arquidiocese de Porto Velho (RO), mas sua história de luta se tornou robusta no estado vizinho, o Acre, onde desenvolveu um projeto em defesa das causas populares da Amazônia.
Os documentos obtidos pelo blog recentemente, provam que os passos de Dom Moacyr Grechi foram monitorados na ditadura que se sucedeu ao golpe que completa hoje 56 anos.
Seus observadores o classificavam como ‘avançado’ nos muitos relatórios encaminhados ao Serviço Nacional de Informação, o SNI, criado para investigar quem se opusesse ao regime.
E Dom Moacyr era mesmo um homem com visão ampliada de sociedade ideal, destinado a transformar, romper a injusta e cruel ordem estabelecida.
Tão logo se tornou bispo em 1986, enfiou na cabeça e no coração a missão de lutar pelos que mais precisam, os invisibilizados e os perseguidos. Ele abriu e nunca fechou os braços aos indígenas, seringueiros, trabalhadores rurais e sem terra, principais alvos dos conflitos agrários na região.
Para Dom Moacyr, só era possível melhorar a vida de todos combatendo a injustiça e o campo e a floresta, precisavam de voz. Da sua voz.
Assim foi pensada a Comissão Pastoral da Terra – CPT e o Conselho Indigenista Missionário – CIMI, que segundo os militares, funcionavam como apoio aos ideais de aparelhos subversivos em resistência ao regime.
Ao detalhar como ocorreu um encontro da CPT em 1975 em Goiânia, o agente foi taxativo:
“Os objetivos, resumidamente são…. identificar lideranças e agrupá-las, fazendo com que os grupos se interligam e, com autonomia, cheguem a ações de pressão para modificar a realidade”.
A CPT fez isso mesmo, se impôs como presença solidária para ajudar na organização e orientação, estimulando os povos da terra na luta por seus direitos.
Os documentos de apoio aos militares para reprimir a CPT eram anexados aos relatórios.
Os registros das reuniões do CIMI eram descritos da mesma forma, com riqueza de detalhes e intensa preocupação com o enfrentamento ao governo proposto por esses movimentos da igreja católica.
Há vários relatórios com o Boletim ‘Nós Irmãos’, da Prelazia do Acre e Purus, com mensagens inspiradoras de Dom Moacyr.
A capa da edição de novembro de 1980 trouxe um coturno militar esmagando indígenas. Um retrato fiel da realidade naquela época e que, infelizmente, convém ao atual momento e governo.
Na guerra entre fuzis e flechas, tombaram milhares de indígenas. Uma guerra com desigualdade de armas que segue provocando a matança dos povos da floresta.
Os militares viam como ‘ameaça vermelha’ todos que estimulassem o pensar e agir, o revolucionar.
Mas, era amor incondicional ao próximo o que Dom Moacyr tinha e deu.
Ele abraçou a luta pela justiça social por seu compromisso cristão.
Em carta ao presidente da Fundação Nacional do Índio, o então bispo escreveu:
“Fazemos um apelo no sentido de que se instrua o sr. José Porfírio de Carvalho a fim de que cesse suas interferências no trabalho de evangelização da Prelazia, O Sr. sabe que, no Acre, não existem áreas indígenas ainda demarcadas e, portanto, não é justo impedir que nossos missionários, como aconteceu recentemente com o Padre Paulino Baldassari, prossigam com suas desobrigas ao longo dos rios e seringais, como viemos fazendo desde a metade do século. De nossa parte, continuamos com as mesmas disposições de continuar servindo à causa indígena naquilo que a Igreja e Jesus Cristo pedem de nós e o Estatuto do Índio previ, esperando que a proibição que nos foi imposta seja revista e brevemente suspensa e que os entendimentos sejam retomados, sem ressentimentos, para o bem dos povos indígenas desta região.”
Está nos registros ditadura: com Dom Moacyr, o Boletim ‘Nós Irmãos’ divulgou muitas denúncias contra os crimes de latifundiários e pedidos ao governo para cessar a perseguição ao trabalho de evangelização.
A nota da Arquidiocese de Porto Velho no seu falecimento, destacou “seu grande amor e incentivo às CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), movido sempre pela profecia vinda do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo (cuja leitura costumava carinhosamente cobrar do povo), bem como um profundo amor pela Santíssima Mãe de Jesus“.
A mensagem de Dom Moacyr que orienta seus fiéis é: O ultimo de todos é o servo de todos”