Eduardo Bolsonaro publicou ontem no Twitter a foto acima com a seguinte legenda: “Reunião no QG com @jairbolsonaro, @FlavioBolsonaro e @CarlosBolsonaro”. É o apartamento do deputado em Brasília. A foto deve ser deste domingo.
Uol, Reinaldo Azevedo
O presidente está com a mesma camisa da pregação golpista. Aliás, ele gosta da peça. Estava com ela no dia 5 de abril, quando convocou um jejum e foi abençoado por um pastor, que jurou, então, que ninguém mais morreria de coronavírus no Brasil. Havia no país 1.281 casos confirmados de Covid-19, com 487 mortes. O pastor garantiu o “Milagre de Bolsonaro”, e tudo mudou: duas semanas depois, neste domingo, contavam-se 2.484 cadáveres e 39.144 doentes.
Se algum ser que não é deste mundo baixou por lá naquele dia, não deve ter sido Deus. Mas sigamos. Voltemos à foto. É claro que chama atenção a culinária invulgar dos Bolsonaros e o estilo para servir. Espiga de milho, ketchup e ovo de Páscoa, tudo regado a Coca-Cola. Em vez de guardanapo, papel-toalha. O presidente, vê-se, dispensa o prato. O sabugo fica dobrado sobre um pedaço de papel, com grãos de milho espalhados pela mesa. Os Bolsonaros inventaram em política a “Estética Bagaceira” — uma coisa, assim, que apela um pouco, ainda que degraus acima na escala social, ao filme “Feios, Sujos e Malvados”, de Ettore Scola.
Não caio no truque. É pura armação, a começar dessa Polo surrada de Bolsonaro. Pertencem à mesma categoria a calça tactel, a camiseta (falsa) do Palmeiras, o chinelão, a caneta esferográfica. Trata-se de um estilo “trash macho”. É um esforço para consolidar a imagem do homem simples, “gente como a gente” — toc, toc, toc… Mas há o que não é armação, mas estilo genuíno. É preciso olhar para a parede. Ali está a visão de mundo da família.
PAREDE QUE FALA
A parede fala. Vê-se lá a imagem de um rifle com uma sequência de balas. A família gosta desses artefatos. Uma das primeiras coisas que Bolsonaro fez ao assumir a Presidência foi tentar universalizar o porte de arma.
Encontrou alguns reveses, mas facilitou posse e porte. Há ainda uma imagem com dois revólveres cruzados. É um dos fetiches dos adoradores de armas nos EUA. Ali está escrito “We don’t call 911” — “Nós não chamamos o 911”, que é o número de emergência naquele país para acionar a Polícia. Ou por outra: com uma arma na mão, você resolve seus próprios problemas. Acham que isto é o suprassumo da autodefesa inteligente: não chamar o 911… É pouco? Vejam a imagem de um homem atirando.
Ampliando, lê-se: “Old school reaça: combatendo a esquerda antes de virar moda”. É uma imagem que circula muito entre bolsonaristas, ilustrando, inclusive, algumas camisetas. Sim, vocês entenderam: pregam que a esquerda deve ser combatida na base da bala. No dia 30 de janeiro, Heloísa Wolf Bolsonaro, mulher de Eduardo, havia mostrado no Instagram imagens da decoração do apartamento. As imagens nítidas dos enfeites de parede vêm de lá. Pois é… Penso na mistura “milho cozido, ketchup, chocolate, Coca-Cola”… Convenham: não fosse um estilo forjado para chamar a atenção, seria de rara heterodoxia. É o de menos.
O que realmente grita na imagem são as escolhas para deixar a parede, digamos, mais bonita, revelando o estilo e o pensamento dos que frequentam o lugar. Havendo generais que passaram a flertar com o golpe, convém que essa parede sirva de advertência. É isso o que querem para o país?