Sara Winter, uma das líderes do movimento “300 do Brasil”, foi presa em Brasília nesta segunda-feira pela Polícia Federal.
Na BBC
O mandado de prisão foi autorizado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Outros cinco mandados de prisão também foram expedidos, mas os demais nomes não foram divulgados. Foram ordenadas prisões temporárias, de cinco dias.
Winter, cujo nome de batismo é Sara Geromini, é uma das investigadas no inquérito das fake news, que apura a disseminação de conteúdo falso na internet.
A prisão, no entanto, foi motivada, por outra investigação, sobre financiamento de atos antidemocráticos, também sob relatoria de Moraes. O mandado atende a um pedido da Procuradoria Geral da República (PGR).
Segundo a PGR, há indícios de que o grupo liderado por Sara esteja organizando e captando recursos financeiros para ações que se enquadram na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983). “O objetivo das prisões temporárias é ouvir os investigados e reunir informações de como funciona o esquema criminoso”, afirmou a Procuradoria-Geral da República.
Os “300 do Brasil” são um grupo armado de extrema direita constituído por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que acampavam em Brasília. O acampamento foi desmontado na manhã do último sábado (13) pelo governo do Distrito Federal. Na ocasião, Winter pediu intervenção do presidente.
No mesmo dia, cerca de 30 apoiadores de Bolsonaro lançaram fogos de artifícios contra o prédio do STF.
No fim de maio, a ativista de 27 anos, foi alvo de busca e apreensão pelo inquérito das fake news. Em seguida, publicou um vídeo afirmando ter vontade de “trocar socos” com Moraes e prometendo infernizar a vida do ministro e persegui-lo.
Por causa de suas declarações, ela acabou expulsa do DEM, partido pelo qual tentou se eleger deputada federal no Rio de Janeiro nas eleições de 2018. Com 17.246 votos, não conseguiu ser eleita.
Winter reconheceu publicamente, pela primeira vez, a existência de armas dentro do acampamento, em entrevista recente à BBC News Brasil.
De acordo com a ativista, as armas serviriam para “proteção dos próprios membros do acampamento”.
“Em nosso grupo, existem membros que são CACs (sigla para Colecionador, Atirador e Caçador), outros que possuem armas devidamente registradas nos órgãos competentes. Essas armas servem para a proteção dos próprios membros do acampamento e nada têm a ver com nossa militância”, afirmou.
A existência de armamento entre os membros do grupo radical despertou preocupação por supostas atividades paramilitares – o que Winter negou.
Por causa disso, o STF autorizou a abertura do procedimento para apurar quem seriam os financiadores do movimento. Na autorização para a investigação que inclui o grupo, a corte ressaltou que a Constituição brasileira veda o “financiamento e a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático” e a “realização de manifestações visando ao rompimento do Estado de Direito”.
À BBC News Brasil, a autoproclamada conferencista internacional disse que defendia “métodos de ação não violenta” e alegou que “absolutamente nenhum dos integrantes dos 300 do Brasil fala sobre ‘milícia armada’, muito menos sobre invadir o Congresso ou STF”.
Mas, em pelo menos uma carreata organizada pelo grupo, tais iniciativas foram defendidas por participantes.
Radicalização
Natural de São Carlos, em São Paulo, Sara Winter vinha apostando na radicalização em seus canais pelas redes sociais, onde diz andar escoltada por seguranças armados, defende que membros do STF “sejam removidos pela lei ou pelas mãos do povo” e apoia o “extermínio da esquerda”.
Entre abril e outubro do ano passado, atuou como coordenadora-geral de Atenção Integral à Gestante e à Maternidade do Ministério da Família, Mulheres, e Direitos Humanos, por indicação da ministra Damares Alves, com quem compartilha bandeiras contra o feminismo e o aborto.
No passado, no entanto, foi uma das fundadoras da variante brasileira do grupo Femen e chegou a “castrar” um boneco que representava o então deputado federal Jair Bolsonaro.
Na ocasião, defendia pautas liberais, incluindo a construção social dos gêneros, o feminismo e a legalização do aborto.
Sua aproximação com o grupo Femen ocorreu, segundo ela, pois queria “de alguma forma exterminar todo o tipo de violência contra a mulher”.
Por causa disso, aos 19 anos, viajou à cidade de Kiev para conhecer uma das líderes do grupo, Inna Shevchenko, e receber treinamento.
Winter voltou ao Brasil em 2012, mas já em 2013, menos de um ano depois de sua inauguração, a filial brasileira foi fechada.
Em comunicado divulgado à época, a sede retirou o direito de Winter de usar o nome Femen. Em maio daquele ano, a ucraniana Alexandra Shevchenko, uma das fundadoras do Femen, afirmou que Winter já “não faz parte do nosso grupo, tivemos muitos problemas com ela. Ela não está pronta para ser líder”.
Na ocasião, a ex-número dois do grupo, Bruna Themis, também criticou o Femen, mas acusou Winter de centralização, autoritarismo e simpatia ao nazismo.
A ativista sempre negou participação em grupos pró-nazismo, mas reconheceu que manteve contato com neonazistas pela internet quando era mais jovem.
Nas redes sociais, usuários destacaram que seu pseudônimo ‘Sara Winter’ faria referência a Sarah Winter, uma militante nazifascista britânica atuante durante a Segunda Guerra Mundial. Winter, contudo, afirmou se tratar de uma “infeliz coincidência”.
Em 2014, a ativista chegou a publicar vídeos no YouTube em que pedia perdão aos cristãos por ter feito parte do Femen e publicou um livro intitulado “Vadia não! Sete vezes que fui traída pelo feminismo”, em que narrava experiências negativas que teve dentro do movimento.
A partir de então, começou a flertar com pautas mais conservadoras, aproximando-se de personalidades como o deputado federal Marco Feliciano (Podemos-SP) e o presidente Jair Bolsonaro (à época deputado federal).
Agora, segundo contou em entrevista à BBC News Brasil, seu foco passou a estar concentrado na convocação de militantes para que “o povo seja a classe soberana do país”.
“Em todos os nossos comunicados dizemos claramente que utilizamos técnicas de ação não violenta e desobediência civil. O que tem a ver ação não violenta com armas? Engraçado como a alcunha de milícia paramilitar foi rapidamente nos atribuída, mas jamais passou perto dos militantes do MST, que carregam armas e facões”, disse ela.
“(Estamos) preparados para dar a vida pela nação, e nossas armas são a fé em Deus, a esperança neste governo e os métodos de ação não violenta.”