Mourão sob fogo

Mourão sob fogo

Desmate da Amazônia sobe 34% em um ano, e vice comemora queda mensal.

Folha em editorial

O primeiro ciclo anual de desmatamento na Amazônia sob Jair Bolsonaro se completou em 31 de julho. Como era de esperar, a devastação segue rampante. Má notícia para o presidente e seu vice, general Hamilton Mourão, ora encarregado de impor lei e ordem na floresta.

A estatística oficial para o intervalo de agosto de 2019 a julho de 2020, fornecida pelo sistema Prodes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), só fica pronta em novembro. Dados preliminares, entretanto, indicam salto de 34% no corte raso.

A alta veio apontada por outro sistema de monitoramento por satélite do Inpe, o Deter, um pouco menos preciso e muito mais ágil (surgiu para orientar em tempo real a fiscalização pelo Ibama). Nesses 12 meses, o Deter emitiu alertas para desmatamento em áreas totalizando 9.173 km², ante 6.838 km² no período precedente.

Operando com resolução mais fraca, o Deter capta a cada ano não mais que 60% da destruição amazônica recenseada pelo Prodes. Dada a diferença, infere-se que a cifra anual acabará fixada em torno de 13 mil km², a maior dos últimos 14 anos e cerca de 3.000 km² acima do apurado em 2018/19.

Mourão, contudo, vê motivo para comemorar. Agarrou-se ao fato de julho ter apresentado a primeira queda em 14 meses nos dados do Deter e enxergou o início de um suposta reversão na tendência de alta. É uma precipitação.

Verdade que os alertas de julho recuaram de 2.260 km² em 2019 para 1.650 km² neste ano. Ainda assim, trata-se do segundo dado mais alto para tal mês e corresponde à superfície do município de São Paulo. Não é pouca coisa.

Não há como congratular-se, como se fora já resultado de incursões das Forças Armadas na operação Verde Brasil 2. Derrubou-se tanta mata, em maio e junho, que os devastadores começaram cedo a incendiar madeira e resíduos já ressecados sobre o solo.

Basta dizer que as queimadas no bioma amazônico subiram 28% em julho, com 119,9 mil focos flagrados por satélites. No mesmo mês do ano passado, haviam sido 93,3 mil. Isso com os incêndios intencionais proibidos pelo governo.

Para piorar seu papel no combate à devastação, Mourão arriscou-se a apontar defeito nos sistemas por satélite do Inpe. Segundo disse o militar ao jornal O Estado de S. Paulo, não seriam os melhores, por empregar sensores ópticos, que podem ser atrapalhados por nuvens, e não radares em drones.

O general recorre ao expediente de insultar o mensageiro. Se almeja tirar o monitoramento da excelência de três décadas do Inpe, só contribuirá para manchar a reputação de seu estamento e alienar ainda mais investidores.

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