Ibama marcou para a próxima sexta-feira (11) o início da audiência pública virtual com ribeirinhos e indígenas sobre projeto de usina hidrelétrica Tabajara.
MPF – Os Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MP/RO) ajuizaram uma ação civil pública contra o Ibama para impedir que a realização de audiência pública virtual com ribeirinhos, extrativistas, pescadores artesanais e indígenas a respeito do projeto de hidrelétrica em Tabajara, distrito de Machadinho do Oeste (RO). Mesmo com o país vivendo em estado de emergência em razão da pandemia provocada pelo novo coronavírus e caminhando para uma segunda onda de aumento dos contágios de covid-19, o Ibama marcou para a próxima sexta-feira (11) o início da audiência pública com a população que será afetada. Não há internet nas vilas e aldeias.
Para o Ministério Público, o Ibama desconsiderou o interesse público. Na ação, o MP aponta que Rondônia tem tido aumento dos casos de covid-19. Para participar da audiência virtual, os ribeirinhos e indígenas terão que se deslocar e se reunir em algum local com acesso à internet, podendo ser contaminados com a doença no percurso ou durante a aglomeração. Muitos pertencem ao grupo de risco e podem não participar por medo do contágio.
A procuradora da República Gisele Bleggi ressalta que o Ibama não levou em consideração o nível de instrução e conhecimento dos atingidos, e a dificuldade no uso das plataformas digitais. “A compreensão de um tema tão complexo como o licenciamento ambiental de uma barragem e o impacto disso na vida dos que serão direta ou indiretamente afetados será impossível à distância”, alerta. Além disso, o edital para a audiência pública foi publicado apenas em 25 de novembro, com prazo de divulgação muito curto.
Os impactos do empreendimento atingirão, além do distrito de Tabajara, muitas outras comunidades tradicionais, terras indígenas e áreas de perambulação de indígenas isolados, tanto em Rondônia quanto no Amazonas.
Desde 2017, o MPF e o MP/RO apontam inúmeras falhas e inadequações técnicas contidas nesses estudos, expedindo recomendações, exigindo a complementação. O Ibama sempre informou que exigiria “no momento oportuno” as complementações dos estudos do empreendedor (Queiroz Galvão S.A, Eletronorte, Furnas e outras empresas consorciadas). Mas, em dezembro de 2019, o Ibama concedeu “aceite” aos estudos e ao relatório apresentado pelo empreendedor, sem exigir as complementações e adequações necessárias.
As recomendações foram feitas a partir de 13 estudos técnicos realizados por peritos do MPF, além de uma análise técnica produzida pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sedam). As principais falhas são sobre a pequena abrangência da área de influência, estudos inválidos sobre os indígenas da região, cálculos falhos da área de remanso do reservatório nas proximidades da terra indígena Tenharim e na relativização da magnitude dos impactos que vinham sendo ignorados e, até mesmo, ocultados pelo empreendedor quando da realização dos estudos.
Em julho deste ano, em razão de pedido de licença feito pela Eletronorte, pressionando pela aprovação do projeto, o Ibama elaborou um parecer técnico, produzido pelos seus servidores de carreira, apontando que, sem as complementações nos estudos, o projeto de construção da usina hidrelétrica de Tabajara é inviável sob os aspectos sociais e ambientais.
O MPF e MPE expediram uma recomendação em 18 de agosto de 2020 advertindo o Ibama para que a audiência pública remota do projeto Tabajara não fosse realizada em substituição à presencial por se tratar de populações rurais, comunidades tradicionais (extrativistas, ribeirinhas, pescadores) e povos indígenas, a maioria integrantes do grupo de risco. A audiência deveria ser realizada em momento e circunstâncias adequados – sem risco à saúde, em formato e língua apropriados, em períodos de tranquilidade de suas rotinas etc.
Naquela época, o Ibama respondeu que não havia previsão de realização da audiência pública. Mas, passados dois meses, o empreendedor pediu a realização da audiência pública ainda neste ano, sob o argumento de ter “realizado todas as complementações”. Para o Ministério Público, isso é impossível porque não haveria como fazer esses estudos em tão pouco tempo. Funcionários do MPF e do MP/RO acessaram o site do Ibama e não localizaram as supostas “complementações”, o que viola o direito à informação.
Os pedidos do Ministério Público à Justiça são para que o Ibama só realize audiência pública presencial e após a pandemia e a complementação dos estudos. MPF e MP/RO pedem a suspensão imediata da audiência pública virtual que foi marcada para a próxima sexta-feira.
A audiência pública só deve ocorrer após consultas aos povos indígenas que serão impactados, habitantes e usufrutuários das unidades de conservação estaduais afetadas, bem como após a elaboração de programas mitigatórios específicos para cada unidade impactada. Os estudos complementares devem ser analisados previamente pela equipe técnica do Ibama.
A ação civil pública foi assinada pela procuradora da República Gisele Bleggi, a promotora de Justiça Naiara Lazzari e o promotor de Justiça Alan Castiel Barbosa. A ação é a de número 10151549420204014100 e pode ser consultada na página do Processo Judicial Eletrônico da Justiça Federal.
Íntegra da ação civil pública.