É preciso eleger um prefeito aberto à agenda socioambiental em Uruará (PA), onde o Ibama só entra com escolta
Fabiano Maisonnave, na FSP
No Acre, o PT, que governou por décadas sob o mote da “florestania”, não conseguiu eleger nem um vereador sequer em Rio Branco em 2020. Por outro lado, estreou no Legislativo municipal Hildegard Pascoal (PSL), após campanha em que espalhou a sua imagem ao lado do pai, o ex-deputado federal Hildebrando. Aquele mesmo, condenado por esquartejar um homem com motosserra.
Em Rondônia, o presidente da Comissão de Meio Ambiente, deputado Jean Oliveira (MDB), foi gravado pela PF cogitando assassinar um procurador de Estado por não “colaborar” com a grilagem de 64,6 mil hectares. Ele não só manteve o cargo como acaba de ser escolhido primeiro vice-presidente da Assembleia.
Poderia encher todo este espaço só com biografias nada ilustres de políticos pela Amazônia, geralmente adeptos do discurso antiambientalista e policialesco. O leitor sulista dirá que o mesmo ocorre no resto do Brasil. É verdade, mas há diferenças. Uma delas é que, no Norte, o contrapeso é mínimo, quase inexistente. Dos parlamentares amazônicos no Congresso, só a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR) tem perfil socioambiental.
No âmbito local, a agenda ambiental levou culpa até pelo colapso de Manaus, pesem os repetidos exemplos de má gestão da saúde e das normas de isolamento. Pois o recém-empossado prefeito, David Almeida (Avante), atribuiu a crise da falta de oxigênio à não pavimentação da estrada que liga o estado ao resto do país.
Em minoria demográfica, populações indígenas e tradicionais fazem resistência, mas vêm perdendo apoio institucional federal com o esvaziamento de órgãos como Funai, Incra e ICMBio, além da paralisação do Fundo Amazônia, que financia projetos sustentáveis.
O geógrafo Ricardo Gilson Silva, da Universidade Federal de Rondônia, chama o processo de desamazonização da Amazônia. Impulsionado pelo agronegócio, prega a expansão da soja e da pecuária, a privatização de terras públicas e a perseguição aos movimentos sociais.
É claro que o agronegócio não emprega a maior parte das pessoas na Amazônia, mas seu modo de ver o mundo vem prevalecendo, aliado ao discurso linha-dura contra a criminalidade urbana. A derrota acachapante do PT do Acre, que não conseguiu implantar de fato o agroextrativismo e deixou que as facções criminosas tomassem conta do estado, é o exemplo mais eloquente.
Contra esse arranjo, pouco importam declarações do presidente francês, Emmanuel Macron, ou campanhas para derrubar o ministro Ricardo Salles (Ambiente). Mais relevante seria eleger um prefeito aberto à agenda socioambiental em Uruará (PA), que vive de madeira ilegal e onde o Ibama só entra com escolta. Quem se atreve?