“A criação de um Ministério de Transição Ecológica é uma grande notícia. A Itália finalmente está aceitando este desafio”. Gaël Giraud é considerado um dos teóricos da expressão que apadrinha o novo ministério criado por Mario Draghi. “No início da pandemia, eu estava em Roma e fiquei impressionado com a inexistência da ecologia no debate político italiano”, conta Giraud, 51, famoso economista francês, jesuíta, que em 2015 publicou “La Transizione ecologica” “Enquanto a juventude instruída e a sociedade civil italiana estão muito bem informadas, a classe política ficou muito atrás. O novo governo, espero, vai compensar esse atraso”.
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A entrevista é de Anais Ginori, publicada por La Repubblica, 21-02-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Quais deveriam ser as características e as prioridades do ministério?
Um grande plano para a reconstrução ecológica do país é, na minha opinião, a única possibilidade de sobrevivência política para Draghi. Caso contrário, se fizer austeridade, como a troika acabará por lhe pedir, terá o mesmo destino de Mario Monti. Em uma situação deflacionária, a austeridade é um remédio pior do que a doença. O mais importante é que este novo ministério não está sob o controle do Ministério da Fazenda. Aliás, deveria ser o contrário. É preciso mudar nosso comportamento econômico e financeiro. Mas isso exige que a velha lógica extrativista, predatória, neoliberal ceda ao realismo da necessária reconstrução ecológica.
A França é um modelo?
Em 2015, a França aprovou uma importante lei de transição que, se implementada corretamente, dará frutos. Mas o atual governo de Macron não está cumprindo seus compromissos. Ele acaba de ser condenado pela justiça francesa, assim como pelo governo da Holanda, por negligenciar seus compromissos no Acordo de Paris. A transição ecológica exige um estado poderoso e estratégico que invista na infraestrutura verde do amanhã.
Em que ponto a Itália está no processo de transição ecológica?
Itália e Espanha são os dois países da Europa Ocidental mais afetados pelos danos ecológicos. Se não fizermos nada, o risco é perder o acesso a mais de 50% da água potável na Itália até 2040. E passaremos fome nas grandes cidades italianas como acontece hoje em Beirute. Mas a Itália possui um recurso extraordinário na transição ecológica, ou seja, sua grande tradição industrial, capaz de inventar a indústria verde e de baixa tecnologia. Existem excelentes cientistas, excelentes engenheiros e uma população instruída capaz de aprender que ‘menos é mais’, como costuma dizer o Papa Francisco.
Como esse desafio se combina com outras prioridades, como desenvolvimento digital, combate às desigualdades?
O desenvolvimento digital é em parte uma ficção: o digital é um grande emissor de CO2, um consumidor de energia e minerais. O 5G, por exemplo, não é absolutamente uma prioridade, exceto em alguns setores muito específicos, como saúde e defesa. A transição ecológica, portanto, requer um discernimento coletivo sobre a sobriedade digital. Por outro lado, a redução das desigualdades é fundamental. Na verdade, são os mais ricos que mais poluem. Redistribuir a riqueza é uma ótima maneira de reduzir a pegada ecológica de uma sociedade.
Você insiste na responsabilidade do sistema financeiro.
Como em todo o Ocidente, o sistema bancário italiano é hostil à transição ecológica e será tentado a se contentar com o green washing. Por quê? Porque, como em todos os lugares, os bancos italianos têm muitos ativos em fósseis em seus balanços. Se fizermos a transição, esses ativos não valerão mais nada e muitos de nossos bancos estarão à beira da falência.