Juiz suspende reintegração de posse em RO e sugere federalização do caso

Juiz suspende reintegração de posse em RO e sugere federalização do caso

Acampamento Manoel Ribeiro, em Chupinguaia, teria de ser desocupado até junho; mas o magistrado viu tema de alta complexidade e risco de violação aos direitos humanos para sugerir que o caso passe a tramitar na Justiça Federal

Por Leonardo Fuhrmann

O juiz Roberto Gil de Oliveira, da 2ª Vara de Conflitos Agrários de Porto Velho, suspendeu por tempo indeterminado a reintegração de posse do acampamento Manoel Ribeiro, em Chupinguaia (RO). Para decidir pela suspensão, ele levou em conta o relatório da Secretaria de Segurança Pública sobre o caso e as considerações do Comando Geral da Polícia Militar. Militantes de direitos humanos defendem que as duas manifestações comprovam uma tentativa de criminalização dos movimentos sociais. Oliveira sugeriu também a federalização do caso, devido à sua complexidade e ao risco de violação dos direitos humanos.

Famílias ocupam a antiga Fazenda Santa Elina, cenário, nos anos 90, do Massacre de Corumbiara. (Foto: Resistência Camponesa)

A ocupação foi feita em agosto do ano passado e reúne mais de 200 famílias, segundo os ocupantes. A Fazenda Nossa Senhora Aparecida é parte da antiga Fazenda Santa Elina, onde, em meados dos anos 90, foi cometido o Massacre de Corumbiara. Oficialmente, catorze ocupantes da terra foram assassinados na operação policial de desocupação do latifúndio, entre eles uma criança de 9 anos. Dois policiais também foram mortos.

A Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia tem o massacre como marco de sua criação. Por isso, além da questão agrária, a ocupação tem um caráter simbólico para o grupo. Os ocupantes não são o único ponto em comum entre a atual ocupação e a do massacre. O atual secretário de Segurança Pública, José Hélio Cysneiros Pachá, é coronel da PM e na época, ainda como capitão, foi um dos comandantes da operação que resultou na morte dos camponeses. Réu, ele acabou absolvido.

POLICIAIS SÃO ACUSADOS DE FORMAR MILÍCIA PRIVADA

A situação ficou mais tensa depois de uma operação comandada pelo Ministério Público prender um sargento, dois soldados e um cabo da Polícia Militar, além de dois funcionários da fazenda. Segundo as investigações, o sargento coordenava o serviço de pistolagem na região, sendo responsável pela logística e recrutamento do bando armado. No momento da prisão, foram encontradas com eles diversas armas de fogo não registradas. Os policiais são acusados de tentar fazer reintegrações de posse na região sem ordem judicial.

Em nota, a Associação Brasileira de Advogados Populares (Abrapo) denunciou várias ações coordenadas pela Polícia Militar contra os camponeses, como o cerco ao acampamento, ataques com gás lacrimogêneo e spray de pimenta e balas de borracha. O local era sobrevoado com helicóptero. Além disso, a Abrapo afirma que há uma pressão para que as secretarias municipais de saúde suspendam o atendimento médico aos assentados da região.

O pedido de reintegração de posse foi feito pela Agropecuária Cabixi. A empresa pertence a Antonio Borges Afonso Filho, Ana Sílvia Pereira de Morais Afonso e Ana Cristina Pereira de Morais Afonso Gottardi. A empresa é dedicada à pecuária bovina de corte, tem sede em Araçatuba (SP) e outra propriedade em Ivinhema (MS).

GOVERNADOR RECEBE APOIO DE NABHAN GARCIA

O governador e coronel Marcos Rocha (PSL-RO) com o secretário de Regularização Fundiária, Luiz Antônio Nabhan Garcia (Foto: Divulgação)

A Defensoria Pública de Rondônia se manifestou contra o despejo, sob a alegação de que a retirada das famílias no meio da pandemia contraria a Recomendação No. 90/2021 do Conselho Nacional de Justiça e a Resolução No. 10/2018 do Conselho Nacional de Direitos Humanos. Aliado fiel do presidente Jair Bolsonaro, o governador Marcos Rocha (PSL) é coronel da PM. Ele chegou a gravar, em Brasília, no fim de março, um vídeo ao lado do secretário especial de Regularização Fundiária, Luiz Antônio Nabhan Garcia, em que pede ajuda do governo federal na repressão às ocupações de terra.

Ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Nabhan Garcia já teve seu nome envolvido com a prática de formação de milícias com o objetivo de atacar e intimidar os movimentos sem-terra: “Milícias e fuzis: as más companhias de Nabhan Garcia, o homem de Bolsonaro para a reforma agrária”. A reportagem do De Olho nos Ruralistas foi publicada no The Intercept Brasil.

Leonardo Fuhrmann é repórter do De Olho nos Ruralistas. |

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