Estudo do MapBiomas comprova a tese de que TIs são importantes contra o desmatamento no país. Na contramão, o congresso discute aprovar PL que dificultará e até extinguirá a demarcação desses territórios em alguns casos.
Por Laís Modelli, G1
Um levantamento feito por imagens de satélites e inteligência artificial do MapBiomas mostra que, entre 1985 a 2020, as áreas mais preservadas do Brasil são as terras indígenas, tanto as já demarcadas quanto as que ainda esperam por demarcação. Nesses territórios, o desmatamento e perda de floresta foi de apenas 1,6% em 35 anos.
“Se queremos ter chuva para abastecer os reservatórios que provêm energia e água potável para consumidores, indústria e o agronegócio, precisamos preservar a floresta amazônica. E as imagens de satélite não deixam dúvidas: quem melhor faz isso são os indígenas”, explica Tasso Azevedo, Coordenador do MapBiomas.
Apesar de serem as mais preservadas, apenas 13.8% de todas as terras do Brasil são reservadas aos povos indígenas, o equivalente a 722 terras indígenas, segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA). Dessas, somente 487 foram homologadas (quando o processo de demarcação foi concluído) desde 1988. O governo de Jair Bolsonaro é o primeiro, desde a redemocratização do Brasil, a não demarcar nenhuma terra indígena.
O futuro dos povos tradicionais, aliás, está sendo decidido e votado em Brasília. Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou a análise de uma ação que servirá de diretriz para as mais de 300 terras indígenas ainda em processos de demarcação no país, que são históricos e lentos.
Além disso, pelo menos dois projetos de lei ganham força no Congresso desde o início do seu governo, em 2019:
- PL nº490/2007: institui o ‘marco temporal’, determinando que teriam direito às suas terras ancestrais os povos que as estivessem ocupando no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988; altera o Estatuto do Índio para permitir, segundo o texto, um “contrato de cooperação entre índios e não índios”, para que estes possam realizar atividades econômicas em terras indígenas; permite que não indígenas tenham contato com povos isolados
- PL nº191/2020: libera a exploração das terras indígenas por grandes projetos de infraestrutura e mineração, abrindo espaço para realização de pesquisa e de lavra de recursos minerais, inclusive de petróleo e gás natural, e para o aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas.
O levantamento também olhou para a situação do desmatamento em cada estado desde 1985 e aponta que, dos 27 estados da federação, 24 perderam vegetação nativa.Os campeões são Rondônia (-28%), Mato Grosso (-24%) e Maranhão (-16%), todos parte da Amazônia Legal.
Apenas dois estados conseguiram manter as áreas de vegetação nativa desde 1985, ambos na região Sudeste, principalmente na Mata Atlântica: Rio de Janeiro e Espírito Santo. No caso do Rio de Janeiro, houve um leve crescimento da vegetação nativa (de 34% em 1985 para 35% em 2020).
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Ainda de acordo com o MapBiomas, as pastagens representam o principal uso da terra no Brasil, ocupando um quinto do território nacional.
Por falar em cobertura e uso de terra no Brasil, as imagens de satélites mostram que o país tem 66,3% de vegetação nativa. Porém, o MapBiomas alerta que as imagens não correspondem, necessariamente, a áreas preservadas.
“Uma parte significativa [da vegetação nativa] passou por processo de degradação ou está em regeneração depois de ter sido desmatada. Por isso, aprofundar o entendimento destes processos de degradação é um dos focos atuais do MapBiomas”, afirma Azevedo.
Cana ocupa o dobro da área urbanizada do país
Se os territórios indígenas permaneceram quase intactos nas últimas décadas, o crescimento da área ocupada por atividades agropecuárias entre 1985 e 2020 foi de 44,6%. Juntas, agricultura e pecuária ganharam 81,2 milhões de hectares no período.
Essas atividades cresceram em cinco dos seis biomas brasileiros, com exceção da Mata Atlântica, segundo o MapBiomas. Porém, mesmo sem crescimento nesses 35 anos, a área de agropecuária no bioma é a maior do Brasil, ocupando dois terços, ou 64,3%, da Mata Atlântica.
Desde 1985, a área de plantio de soja e cana alcançou a mesma extensão de toda a formação campestre do Brasil. A soja já equivale a um Maranhão e a cana ocupa o dobro da área urbanizada do país.
O padrão de expansão da agropecuária nesse período é o avanço das pastagens sobre áreas de vegetação nativa enquanto a agricultura se expande principalmente sobre áreas de pastagem. Com isso a área total de pastagem parou de crescer em meados dos anos 2000 e começou a encolher, registrando uma retração de 4% de 2005 a 2020, depois de crescer 45% entre 1985 e 2005.