Delegadas dão dicas às mulheres como evitarem estupros

Delegadas dão dicas às mulheres como evitarem estupros

Rondoniaovivo, por Felipe Corona – Polêmica e debates surgiram após apresentador de TV falar que estupros podem acontecer por uso de roupas das vítimas

Na segunda-feira passada (31/01), o apresentador de Ariquemes, Wilson Rodrigues, mais conhecido como Pica-Pau, deu uma sugestão ao vivo no programa Plantão de Polícia, que causou grande repercussão nas redes sociais.

Após uma pergunta de um telespectador sobre como evitar estupro, Wilson Rodrigues falou que: “É só você usar roupa curta normal e ir numa festa de gente decente que tu não vai”.

Pica-Pau ainda teria culpado as vítimas por usarem roupas curtas demais.

“Tem umas menininhas de 13 e 14 aninhos que se ‘maqueia’ e veste umas roupas muito comportadas… Não tem o short jeans? Elas não usam o short, usam o cós do short. Ficam parecendo rapariga, moça, e vão para esses ‘lugar’, dessas festinhas, enche a cara, fica bêbada, cai na piscina, morre ou enche a cara e é estuprada por um monte de moleque”, disse ele.

Repercussão

Depois do fato, uma grande discussão tomou conta da internet. Muitas mulheres e grupos de defesa dos direitos femininos se manifestaram contra as declarações do apresentador de televisão.

A titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), Amanda Ferreira Levy, deu dicas de como as mulheres podem se proteger caso se sintam ameaçadas ou vítimas de abusos sexuais.

“Todos os crimes sexuais são ações praticadas pelos autores/agressores, sendo única e exclusiva responsabilidade deles a prática delituosa. Responsabilidade essa inafastável, haja vista a previsão contida no artigo 225 do Código Penal, que estabelece que todos os crimes sexuais sejam de ação penal pública incondicionada. Ou seja: não dependerão da manifestação de vontade das vítimas para que sejam apurados. Além da vítima, qualquer pessoa que tenha conhecimento de qualquer crime sexual poderá realizar a denúncia e os fatos serão devidamente investigados e apresentados à Justiça”, afirmou Amanda

A delegada da mulher ainda explica o que pode acontecer para quem acha que ficará impune caso comenta alguma violência sexual contra o sexo feminino.

“O suspeito irá responder criminalmente e pode ser condenado a penas que variam de 6 a 10 anos de reclusão, podendo chegar até 30 anos, se houver qualificadoras. Toda conduta que viola a dignidade sexual é de responsabilidade exclusiva por quem a pratica e somente ele será investigado e devidamente julgado. É proibido também pelo artigo 400-A do CPP quaisquer menção ofensiva à dignidade da vítima, sob pena de responsabilidade civil, penal e administrativa”, pontuou ela.

Protestos

O fato envolvendo o apresentador de TV, Wilson Rodrigues (Pica-Pau), após a divulgação do vídeo pela jornalista Luciana Oliveira, por meio de seu blog de notícias (Blog da Luciana Oliveira). Ela contou ao Rondoniaovivo como soube das suposições do comunicador.

“Fui procurada por mulheres que se revoltaram com a fala criminosa e a postura debochada do apresentador ao se referir ao crime de estupro culpando as vítimas pelas roupas que vestem. Como mulher, jornalista e ativista das causas das mulheres, larguei tudo que estava fazendo para denunciar no meu blog e mobilizar os colegas da imprensa”.

Para Luciana, o debate causado e os protestos tiveram algum impacto na sociedade rondoniense, mas é preciso fazer mais para que casos semelhantes não voltem a acontecer.

“A repercussão mostrou ao apresentador o que significa a campanha #NinguemSoltaaMaoDeNinguem, da qual zombou. Ele jamais pediria desculpas por vontade própria. Foi obrigado e recebeu uma punição moral como profissional. Falta a RedeTV punir exemplarmente. Mas, agora não vai seguir estimulando em seu programa que estupradores ajam em razão de vestimentas femininas. Esse é o verdadeiro papel da imprensa: proteger a sociedade e não causar danos por qualquer meio de comunicação. As vítimas nunca podem ser culpadas sob nenhum argumento, principalmente adolescentes a quem ele se referiu”.

Mais orientação

A delegada Rosilei de Lima também gravou um vídeo divulgado nas suas redes sociais onde explica como a lei é aplicada em casos de estupro.

“A figura penal fala em alguém. Não fala na mulher, no menor. Fala em alguém. Uma figura, uma pessoa, que pode ser do sexo feminino ou masculino. Pode ser uma criança ou um homem, inclusive. Quando você vai investigar o crime de estupro, a qualidade da vítima, se ela estava nua, se estava dançando em um pole dance (palco com uma barra de ferro), se estava fazendo strip-tease ou caminhando na pista, é irrelevante pra apuração do crime. A conduta da vítima”, destacou ela.

Rosilei também ressaltou que mesmo que maiores de 18 anos que estejam em festas acompanhados de outras adolescentes, também serão punidos conforme a lei, caso comentam algum abuso ou violência sexual.

“O que ele falou [Pica-Pau], a menina ir para uma festa, com roupa decotada, que ela fatalmente vai ser estuprada, por ela estar se colocando em uma situação de perigo, e os moleques vão fazer isso mesmo, por estarem nessa fase, serão responsabilizados. Com até 15 anos de prisão se essas meninas forem menores de idade e eles maiores de idade”.

Dados

Um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública feito em parceria com a Unicef (órgão das Nações Unidas para a Infância) divulgado em 2021, revelou que cerca de 100 crianças e adolescentes de até 14 anos são estupradas por dia no Brasil.

Na maioria das vezes o estupro ocorre na residência da vítima e é praticado por pessoa conhecida. Não há qualquer associação do crime à roupa no perfil traçado das meninas que representam 86% das vítimas de estupro.

O mapeamento mostrou que 179.277 estupros ocorreram entre 2017 e 2020 e que a subnotificação torna o cenário de violência sexual contra menores ainda mais grave.

Explicações

Em contato com o Rondoniaovivo, Wilson Rodrigues ainda tentou explicar os motivos da colocação.

“Isso é o pessoal da lacração. Tudo começou por causa da galerinha que foi participar de um evento que ‘moiou’. Não pelo Pica-Pau apresentador de Ariquemes, Rondônia, mas pela Polícia Militar. Onde os pais, a mãe que não sabia onde a filha estava, que ia tomar um tereré na casa da amiga e ia dormir lá. Mas descobriram que elas estavam em uma festa particular, em uma fazenda com piscina”, comentou ele.

Ainda de acordo com o apresentador, a maioria dos ataques foi feito por familiares dos envolvidos ou por perfis falsos nas redes sociais.

“Fui olhar, só tinha fakes. Ou aquele que eu já falei aqui na TV por ser preso com maconha, por roubo, tudo né… E as menininhas quase nuas, embriagadas. Eu falo porquê sou pai de uma menina de 07 anos de idade. Meu comentário não saiu do nada, só sobre vestimenta. São pessoas que querem ganhar likes e fama. Vocês lembram do hashtag Mexeu com uma, Mexeu com Todas? Acabou!”.

E repetiu o que ele teria dito no programa: “Meninas de 13 aninhos, chapadas, com umas roupinhas, com maquiagem parecendo biscate, em tempo de serem estupradas. A roupa não define a mulher. Larga de serem idiotas, de vocês postarem o que vocês não sabem!”.

Sem apoio

A direção da RedeTV Rondônia, que é uma das empresas do Sistema Gurgacz de Comunicação (SGC), divulgou nota condenando a colocação do apresentador Wilson Rodrigues.

“A RedeTV Rondônia repudia a expressão machista do apresentador Pica-Pau, pois não condiz com a linha editorial adotada. Como a emissora de Ariquemes opera de forma terceirizada, respondendo civil e criminal pelos atos de seus colaboradores, estaremos acionando administrativamente no que é competência das partes no contrato de arrendamento”.

Já o próprio Pica-Pau divulgou uma nota de repúdio da emissora onde trabalha, com a seguinte legenda: “Atenção lacração, agora acabou o mimimi”.

“A RedeTV Ariquemes em respeito à todos os telespectadores, informa que, não compactua com a opinião do apresentador. O comunicador Pica-Pau foi infeliz em suas colocações após a exibição de uma matéria na edição da segunda-feira (31/01)”.

A nota ainda segue que “o apresentador já se retratou com o público, pedindo desculpas na edição da terça-feira (01). A direção da emissora já tomou medidas administrativas cabíveis sobre o caso”.

Contatos

A Delegacia da Mulher está localizada na Avenida Amazonas, 8145, Bairro Escola de Polícia. O telefone é o 98479-8255, onde podem ser realizadas todas as denúncias.

190 – Polícia Militar, casos de flagrantes;

180 – Portal do Governo Federal

197 – Disque denúncia anônima da Polícia Civil ou delegaciavirtual.pc.ro.gov.br, além das demais UNISPs da capital ou qualquer delegacia da Polícia Civil em funcionamento.

Ministério Público – (69) 98408-9931

Defensoria Pública – (69) 99204-4715

OAB – (69) 99283-4762

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