Governo busca se eximir de responsabilidade sobre mega aumento dos combustíveis, mas especialistas apontam a política de preços adotada pela Petrobras e o desmonte de sua cadeia produtiva como principais culpados pela oscilação de preços que castiga os brasileiros.
Por Redação RBA
São Paulo – Na quinta-feira (10), a Petrobras anunciou um novo aumento nos combustíveis, elevando o valor da gasolina em 18,8% e do diesel em 24,9%. O gás de cozinha (GLP) também teve acréscimo de 16,1%, passando de R$ 3,86 para R$ 4,48 por quilo. Como sempre, o presidente Jair Bolsonaro não atribuiu o novo reajuste à criticada política de preços da empresa, adotada no governo Temer e mantida em sua gestão. Preferiu culpar a crise mundial, o PT e o STF, se eximindo de qualquer responsabilidade. Seus apoiadores vão atrás ainda de um outro bode expiatório, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e os governadores. Mas as desculpas já não funcionam.
Segundo o analista de redes Pedro Barciela, na discussão que envolve o aumento dos combustíveis no Twitter, os bolsonaristas representaram, entre 300 mil menções analisadas nesta sexta-feira (11), apenas 11% das postagens, demonstrando uma situação de isolamento.
“Ataques contra governadores, que já tinham baixo impacto nas redes, hoje se mostram ainda mais ineficazes”, postou Barciela. “O campo de atores que se indignaram com o novo aumento é amplo, plural e composto por usuários que não se engajam com a política partidária nas redes sociais. Tem até adolescente reclamando do preço da gasolina ‘bem na minha vez’. Abertura de espaço para a ‘nostalgia’…”
De acordo com o Dieese/seção Federação Única dos Petroleiros (FUP), desde a adoção do PPI, em outubro de 2016, a gasolina e o óleo diesel na refinaria tiveram reajuste de 157%, enquanto a inflação foi de 31,5% no mesmo período. A alta acumulada foi ainda maior em relação ao gás de cozinha, 349,3%. Ao mesmo tempo em que a Petrobrás distribuiu em fevereiro R$ 101 bilhões para seus acionistas, referentes aos resultados de 2021.
“Temos assistido nos últimos três anos o discurso irresponsável do governo federal tentando confundir a população ao colocar a culpa dos aumentos frequentes dos combustíveis nos impostos estaduais, como sabemos, o ICMS. É óbvio que esse tributo representa uma parcela do preço final, mas as suas alíquotas não foram majoradas nos últimos dez anos em nenhum estado. Pelo contrário, houve redução das alíquotas de ICMS sobre os combustíveis em vários estados”, apontou, em sessão realizada na Câmara Municipal de Joinville (SC), o dirigente do Sindipetro Paraná e Santa Catarina Jordano Zanardi.
Ele destacou que a incidência do ICMS da gasolina no Brasil varia entre 25% e 34%. “Santa Catarina tem o menor percentual do país, com 25%, desde que o imposto foi criado, em 1988. Portanto, há mais de 30 anos congelado. Se a alíquota do ICMS está congelada ou reduzindo, por que os preços dos combustíveis subiram tanto e continuam aumentando? Esse é o debate que deve permear essa casa legislativa e todas as demais Brasil afora. A resposta está na sigla PPI, Preço de Paridade de Importação, que é a atual política de preços de combustíveis definida pelo governo federal, que é o acionista controlador da Petrobrás, em conluio com os acionistas privados.”
O impacto do mega aumento de combustíveis
A mudança na política de preços da Petrobras se deu na gestão do presidente nomeado por Michel Temer para a companhia, Pedro Parente, fato que não passou despercebido pelo assessor econômico na Câmara dos Deputados do PSOL e professor voluntário de Economia na Universidade de Brasília (UnB), David Deccache.
“A fome e a miséria são o outro lado da moeda da riqueza dos grandes acionistas da Petrobras. A política de preços da Petrobras imposta à sociedade após o golpe de 2016 está sendo comemorada pelos acionistas milionários e importadoras. Mais um legado do golpe de 2016”, publicou, em seu perfil no Twitter.
Mas não é só a política que atrela o preço dos combustíveis no Brasil ao valor do barril no mercado internacional e às variações do câmbio o responsável único pelo aumento dos combustíveis. O economista e professor da Universidade Federal da Bahia (FBA), Uallace Moreira, atenta para o desmonte da cadeia produtiva da Petrobras que tornou o país mais dependente em relação ao exterior.
“Importante lembrar que a Petrobras vem aumentando lucro com a política de preço e destruindo a cadeia produtiva da empresa, aumentando a dependência do país na importação. Além disso, destruindo a empresa com a brutal queda dos investimentos.. Agora vemos o resultado…”, postou. Citando dados do também economista William Nozak, Uallace lembra que se a Petrobras não tivesse reduzido sua capacidade de processamento e investimentos na área de refino, hoje não haveria dependência da importação de 30% de gasolina, diesel e gás, assim como e não teriam entrado no país 392 importadores de combustíveis “fazendo pressão para que a PPI permaneça”.
Para o economista da UFBA, a mudança de orientação em relação aos preços dos combustíveis é fundamental. “Diante do cenário atual, mais do que nunca precisa discutir a política de preços da Petrobras. É uma política de exploração dos trabalhadores e transferência de lucros para uma minoria. 40,5% das ações nas mãos de estrangeiros. 22,7% nas mãos de acionistas brasileiros.”
Estabilização dos preços dos combustíveis
Na noite desta sexta-feira (11), o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou o projeto de lei que altera a cobrança de ICMS sobre combustíveis. O PLP 11/2020, aprovado na Câmara dos Deputados ontem e no Senado na quinta-feira (10), prevê a incidência do ICMS uma única vez sobre os combustíveis, inclusive os importados.
Na quinta, os senadores também aprovaram o Projeto de Lei 1472/2021 de autoria de Rogério Carvalho (PT-SE) e relatado por Jean Paul Prates (PT-RN), que cria a Conta de Estabilização de Preços dos Combustíveis (CEP-Combustíveis), estabelecendo um auxílio de até R$ 300 mensais para motoristas autônomos de baixa renda. O projeto ainda não tem previsão de votação na Câmara.
O coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar, aponta que o PL 1472/2021 “é apenas um primeiro passo para a autonomia do país e dos brasileiros”, sendo resultado “de uma bancada de oposição que não aposta no quanto pior melhor, e que precisou apresentar uma medida paliativa, em um cenário de omissão do governo federal e da gestão da Petrobrás, que terceirizaram parte do problema para os governadores”.
“Apesar de ficar felizes com a notícia, não podemos esquecer de que a grande solução para abaixar os preços dos derivados é a revogação imediata do Preço de Paridade de Importação, que é o grande culpado pelos aumentos abusivos dos combustíveis desde que adotado pela gestão golpista da Petrobrás em 2016”, acrescentou Bacelar.