Chance de vitória de Lula em 2 de outubro pode depender de votos de eleitores que já declararam outras preferências
Felipe Mendes – Brasil de Fato
Embora os institutos de pesquisas apresentem números levemente divergentes nos últimos levantamentos sobre as intenções de voto para a presidência da República, todas as pesquisas com credibilidade apontam que a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em primeiro turno é uma possibilidade real. Nesse contexto, cresce a importância do chamado “voto útil”, ou seja: aquele dado por um eleitor que não tinha o candidato como primeira preferência, mas que faz a escolha visando encerrar a disputa sem necessidade do segundo turno.
Segundo pesquisa divulgada no último sábado pelo Ipespe, 68% dos eleitores preferem que o resultado esteja definido já no primeiro turno. Esse movimento já foi detectado pela campanha de Ciro Gomes (PDT), candidato que inclusive perdeu apoiadores dentro do próprio partido e militantes que se posicionaram ao lado dele nos últimos anos. São pessoas que defendem o voto em Lula em uma eleição que desde o início se desenhou “plebiscitária” entre o petista e o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL).
:: Ipec: Lula oscila para cima e pode vencer no primeiro turno ::
Para a professora de ciência política Mayra Goulart, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), dois componentes se somam para fazer crescer o movimento por este “voto útil” nas eleições presidenciais de 2022. O primeiro é algo que já existe há muito tempo, e tem relação com uma negação da política por grande parte da população. O outro é a ameaça representada pela candidatura de Bolsonaro.
“Tem aquele eleitor que vê a política como perda de tempo, que diz: ‘não quero sair de casa mais uma vez para votar’, isso não é novidade. Mas existe também o medo de que o resultado das urnas não seja respeitado. Não estamos diante de uma eleição normal, temos um extremista com viabilidade eleitoral, o Bolsonaro. Em 2018 foi a primeira vez que isso aconteceu: um candidato de extrema-direita com viabilidade. Isso nunca tinha acontecido na nova República”, pontua.
Para Goulart, uma eventual vitória de Lula em primeiro turno diminuiria a chance de contestação dos resultados – uma ameaça constante de Bolsonaro há muito tempo, já que a escolha do presidente aconteceria junto com a eleição de milhares de parlamentares pelo país. Em tese, se levar a cabo a ideia de rejeitar o resultado das urnas, Bolsonaro não encontraria eco, já que a eleição de Lula aconteceria no mesmo dia de vitórias ou reeleições de deputados, senadores e até governadores que venham a ganhar também sem necessidade de segundo turno. Nesse contexto, o voto útil ganha importância.
“O voto útil é comum em todo lugar do mundo. Em uma eleição há espaço para novas propostas, ideias, programas. Mas quando a campanha vai avançando, vai havendo diferenciação entre as que de fato têm viabilidade eleitoral e as que não têm. É muito provável que, quanto mais perto da reta final, votos em candidatos que não se viabilizam eleitoralmente tendam a migrar para outras candidaturas”, explica.
O cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aposta em um movimento de migração de votos nestes últimos dias de campanha, especialmente no caso de potenciais eleitores de Ciro. Para ele, parte dos apoiadores do pedetista deve migrar para Bolsonaro, mas a maior parte dos que mudarem o voto em cima da hora devem aderir a Lula, que, com isso, pode confirmar a vitória em primeiro turno.
Couto, responsável pelo canal “Fora da Política Não Há Salvação” no Youtube, aponta que “esta é uma eleição diferente de outras e há muita coisa em jogo”. Ele lembra que a tendência ao voto útil é comum nas retas finais de disputas eleitorais, em maior ou menor grau. Desta vez, porém, há uma motivação maior que a habitual, e a repulsa a Bolsonaro pode aumentar esse movimento.
“Quando olhamos para dados das pesquisas, vemos que pelo menos metade dos eleitores do Ciro, quando perguntados, dizem que podem mudar de voto. Da Simone Tebet é um número parecido. No caso do Lula ou do Bolsonaro, esse percentual é bem menor, fica entre 10% e 20%. Mudar em cima da hora estando vinculado a um candidato mais forte é muito menos provável que mudar quando se vota em um candidato mais fraco eleitoralmente”, comenta.
Qual deve ser a postura da campanha petista?
Para Couto, a campanha de Lula deve trabalhar de maneira sutil para atrair os votos dos indecisos ou de pessoas que declararam preferência por outros candidatos. Ele explica que é fundamental evitar uma campanha que fale coisas como “não vote no Ciro ou na Simone pois eles não têm chance e eu tenho”, já que isso pode afugentar o eleitor e dificultar a criação de novas alianças num possível segundo turno.
“A gente tem de partir da premissa mais simples: todo candidato busca votos, e para isso é preciso se apresentar como uma opção melhor, não falar de maneira negativa sobre a preferência daquele eleitor. Diante disso, o que o Lula tem de fazer é dizer: ‘vote em mim’. Tem que ter um ‘jeitinho'”, aponta.
Mayra Goulart complementa reforçando a necessidade de se destacar que não se trata de uma eleição “normal”. Ou seja: é preciso reforçar a tese de que o que está em jogo são as instituições democráticas do país.
“É preciso deixar claro que, não só estamos diante da escalada autoritária do Bolsonaro, mas também de uma condução econômica que esvazia políticas públicas, de educação, saúde, infraestrutura. Existe a possibilidade do país entrar em um estado de convulsão. Derrotar essa possibilidade deve ser a grande bandeira capaz de unir os eleitores e levar o Lula à vitória no primeiro turno”, conclui.
Edição: Rodrigo Durão Coelho