Desculpe-me o leitor pudico

Desculpe-me o leitor pudico

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Por Gregório Duvivier

Peço desculpas ao leitor pudico, mas tem horas em que apenas uma palavra chula pode dar conta do espanto. Caralho.

“Por que não cacete?”, dirá o leitor pudico. Um cacete, leitor pudico, neste caso não basta. Tampouco porra faria efeito. Claro que porra tem o seu valor. Mas esta semana, especificamente esta semana, pedia um caralho. “E por que não ‘buceta’?”, sugerirão, quem sabe. “Até as exclamações precisam ser falocêntricas?” Mas caralho, explico, tem pouco tem a ver com o falo em si. Diria, inclusive, que o caralho é o oposto do pênis.

Enquanto pênis é o pau quando observado na condição de órgão sexual, o caralho é o pau em sua condição exclamativa ou evocativa. Assim como a língua inglesa diferencia o porco vivo (“pig”) do porco no prato (“pork”), a língua portuguesa difere o pau imanente do pau transcendente. Não se diz, em português, “como é bonito o seu caralho” ou “sinto dores no caralho”. O caralho nunca é o seu, tampouco é o dos outros.

A expressão “ai, meu caralho!” difere da expressão “ai, meu pau” porque pode, inclusive, ser dita por uma mulher, assim como “ai, meu saco” (enquanto o pau é sempre literal e o caralho é sempre metafórico, o saco pode ser ao mesmo tempo literal e metafórico). Por isso, quando alguém se referir à casa do caralho, não estará falando das cuecas, tampouco estará falando de quaisquer órgãos sexuais em que ele possa se encaixar. Da mesma maneira, quando diz-se que uma cerveja é “boa pra caralho” não se está dizendo que a aplicação da cerveja na região peniana trará benefícios à saúde do mesmo.

Antes que os filólogos me ataquem: não estou dizendo que o caralho não tem forma. Tem, sim. Por isso, pode-se comentar que tal cabeça tem “formato de caralho”, ou perguntar, como Noronha em “Sete Gatinhos”, “quem foi que desenhou caralhinhos voadores na parede do banheiro?” (RODRIGUES, Nelson; 1958). O que disse foi que o caralho é platônico: pertence ao campo das ideias.

Peço, então, licença-caralho para usar a expressão platônica à vontade, porque no momento presente eu tô cheio de dúvidas. Ou melhor, tenho dúvidas pra caralho.

Por que caralhos foi cair logo o avião do relator da Lava Jato? Que caralhos ele estava fazendo lá dentro daquele caralho? E por que é que foi cair logo lá na casa do caralho? E o pior: é verdade que estão pensando em pôr no seu lugar o ministro que tem a cabeça em formato de caralho? Isso vai dar uma merda do caralho.

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