Certa vez, Ailton Krenak questionou em entrevista: “Por que se comemora a presença do índio em território brasileiro, ou se faz um esforço para que o índio seja lembrado e até exaltado a todo dia 19 de abril se o índio incomoda tantos cidadãos brasileiros? Por que comemorar?”. E é desse questionamento que partiremos.
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Como surgiu o dia do índio?
O dia do índio nasce do Congresso Indigenista Interamericano em Abril de 1940, realizado em Patzcuaro no México. Participaram os seguintes países, com seus representantes:
- México: Luis Chavez Orozco, chefe do Departamento de Assuntos Indígenas do México e coordenador do Congresso Interamericano.
- Colombia: César Uribe Piedrahíta, um do delegados oficiais;
- Chile: Venancio Coñuepán Huenchual, ascendência mapuche, deputado e ministro da República do Chile. Foi o diretor de Assuntos Indígenas;
- Bolivia: Antonio Díaz Villamil, escritor e historiador; ocupou o cargo de Diretor Geral de Educação;
- Brasil: Edgar Roquette Pinto, membro do Conselho Nacional do Serviço de Proteção ao Índio (SPI);
- Equador: Pío Jaramillo Alvarado e Víctor Gabriel Garcés;
- Estados Unidos: John Collier e os antropólogos John Cooper, Sophie Bledsoe Aberle e Matthew Stirling;
- México: Además de Chávez Orozco, Moisés Sáenz Garza, um dos promotores do encontro, secretário da Comissão Organizadora e Vicente Lombardo Toledano, secretario da Confederação dos Trabalhadores do México;
- Panamá: Rubén Pérez Cantule, etnia cuna;
- Peru: José Angel Escalante, presidente da delegação peruana e ex-prefeito de Cuzco em 1919 e ministro da Justiça em 1930; Luis Eduardo Valcárcel Vizcarra, antropólogo e pesquisador do pré-hispânico no Peru; José Uriel García, educador peruano; José María Arguedas, escritor e antropólogo.
A reunião de líderes políticos deixou os indígenas desconfiados de que mais uma vez houvesse uma tentativa de aproximação sem conversas envolvendo os povos, o que gerou um afastamento dos próprios indígenas, que temiam pela segurança dos líderes indígenas, e em um primeiro momento não toparam participar do evento.
Por que dia 19 de abril?
Mas no dia 19 de abril, os indígenas aceitaram se unir aos líderes políticos que estavam reunidos no México em busca da participação por representatividade na tomada de decisões. Com a participação indígena a partir daquela data, acordos foram feitos e a maioria dos países presentes se comprometeu em acatar a luta por respeito e igualdade de direitos dos Povos.
Quando se fala em respeito, se fala em respeito à identidade e cultura, e estabelecer o dia do índio no dia 19 de abril foi um marco para simbolizar esse acordo. Porém, apenas no dia 2 de junho de 1943, três anos depois do acordo feito no México, o então presidente do Brasil, Getúlio Vargas assinou o decreto nº 5.540, instaurando o dia 19 de Abril o dia do “índio”.
Há motivo para comemorar o dia do índio?
Então voltamos a pergunta: por que comemorar? Qual motivo leva o Brasil a comemorar o dia do “índio”? Uma história fantasiosa. Brasil afora, a população que se espalha pelos atuais 26 estados e Distrito Federal pouco sabem sobre os Povos originários desta terra, pouco falam de sua diversidade e luta, sequer sabem seus nomes, ou seu verdadeiros nomes, importante dizer, em sua própria línguas.
Por que falamos índio diante de tanta diversidade entre esses Povos? Diante da certeza de que esses são os donos da terra em que hoje está o Brasil e não “índios” como imaginou Cabral desejando chegar a Índia em 1500. Somos os Povos Indígenas, aqueles que habitam a terra antes de sua colonização, aqueles que são diversos, em línguas, cores, culturas, espiritualidades e sexualidades. Existe muito mais beleza na diversidade indígena brasileira do que na história inventada sem cores e escrita por brancos.
Um mês ignorante de conhecimento se transforma em desfile de falsos cocares e pinturas nas escolas, que reforçou por anos um estereótipo, e que pela mão manchada de ucrucum e jenipapo de indígenas está sendo transformado em um ato de resistência, de sobrevivência e de informação.
Começou há muitos anos o Abril Indígena, uma lembrança de que todo dia é dia dos Povos indígenas, e assim construímos uma nova história uma história de outros 500 anos de resistência, muito mais do que comemoração vazia.